Os números que ilustram essa mudança fazem parte do Indicador de Comércio Exterior (Icomex), estudo mensal do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV), divulgado nesta segunda-feira (14).
Declínio na participação americana no comércio brasileiro
Entre 2001 e 2024, a participação dos Estados Unidos nas exportações brasileiras caiu de 24,4% para 12,2%, o que representa uma redução de quase 50%. Enquanto isso, a China, que atualmente é o principal parceiro comercial do Brasil, aumentou sua fatia de 3,3% para 28% no período, mais de oito vezes.
Também tiveram redução a participação da União Europeia, em 44%, e da América do Sul, em 31%, refletindo a crescente influência do gigante asiático nos negócios internacionais do Brasil. Mesmo assim, esses blocos continuam à frente dos Estados Unidos em participação nas exportações.
Participação nas exportações brasileiras:
- China: 28%
- União Europeia: 14,3%
- América do Sul: 12,2%
- Estados Unidos: 12%
Redução na relevância nas importações
O levantamento aponta também que, em 2001, 22,7% das compras do Brasil vinham dos Estados Unidos. Em 2024, essa cifra caiu para 15,5%, uma retração de 32%. Nesse mesmo período, a presença da China na pauta de importações saltou de 2,3% para 24,2%, mais de dez vezes.
As participações da União Europeia e da América do Sul também recuaram, em 31% e 45%, respectivamente.
Participação nas importações brasileiras:
- China: 28%
- União Europeia: 18%
- Estados Unidos: 15,5%
- América do Sul: 10,2%
Exportações brasileiras: perfil e riscos
As exportações destinadas aos Estados Unidos possuem um perfil diversificado. Para efeito de comparação, na China, apenas três produtos correspondem a 96% do que o Brasil vende: petróleo, soja e minério de ferro. Já para os EUA, 10 produtos representam 57% das vendas brasileiras.
Entre os principais produtos exportados para os americanos, destacam-se óleos de petróleo, produtos de ferro e aço, aeronaves, café, ferro-gusa, óleos combustíveis, celulose, equipamentos de engenharia e sucos de frutas.
O estudo aponta que setores como siderurgia, aviação, alimentos e máquinas podem ser mais prejudicados por uma eventual agravamento na tarifa americana, sobretudo naqueles que dependem bastante da maior economia do mundo. Exemplos:
- ferro fundido e ferro spiegel: 86% das exportações vão para os EUA;
- produtos semimanufaturados de ferro ou aço não ligado: 72,5%;
- veículos aéreos, incluindo helicópteros e aviões: 63%;
- escavadeiras e pás mecânicas: 53%;
- sumos de frutas: 34%.
Perspectivas de mercado e desafios
Especialistas avaliam que produtos primários, como carnes e sucos, podem escapar dos efeitos adversos, mas buscar novos mercados será um desafio complexo. A concorrência com a China, além das dificuldades de deslocar a produção, tende a dificultar a diversificação de destinos, especialmente para produtos manufaturados, muitos fabricados por multinacionais americanas.
“Não é simples desviar as exportações em um prazo curto, e há muita concorrência com a China”, pontua Lia Valls, consultora do Icomex/FGV.
Ações de Trump e o cenário atual
O boletim da FGV lembra que, em abril, o ex-presidente Donald Trump ameaçou países parceiros com tarifas de até 145% contra a China. Quanto ao Brasil, a tarifa de 50% anunciada na semana passada representa uma escalada, influenciada por fatores políticos, incluindo processos no STF contra ex-presidentes e decisões envolvendo gigantes de tecnologia.
Apesar dessas ameaças, a estimativa do estudo é que o governo americano possa retroceder na taxação devido ao histórico de Trump e à pressão de empresas americanas prejudicadas por essas medidas.
Reações e estratégias do Brasil
O governo brasileiro busca argumentos para reverter a taxação e sinaliza com medidas de reciprocidade, como a Lei da Reciprocidade Econômica, que aumentaria tarifas de importação dos EUA. O Supremo Tribunal Federal também reforçou que não há perseguição política no país, questionando fundamentos das ações norte-americanas.
Segundo o estudo, o saldo bilateral do comércio entre Brasil e Estados Unidos, que desde 2009 não registra superávit, está negativo em US$ 1,7 bilhão no primeiro semestre de 2025, evidenciando que o Brasil tenta equilibrar sua balança comercial diante desses desafios.
Impactos e expectativas futuras
Especialistas ressaltam que há possibilidades de negociação e que novas políticas podem surgir para mitigar os efeitos das tarifas. No entanto, a dependência de alguns produtos e a influência política tornam o cenário incerto. A análise indica que a relação comercial dos Estados Unidos com o Brasil continuará a passar por ajustes nos próximos anos.