Há três décadas, Srebrenica, na Bósnia, se tornava o cenário de um dos episódios mais sombrios da história recente, com o massacre de mais de 8 mil muçulmanos bósnios. Na mark, dom Tomo Vukšić, arcebispo de Vrhbosna, Sarajevo, convoca a sociedade a refletir sobre o legado daquele trágico evento. Para ele, a construção de um futuro pacífico depende do diálogo e da compreensão mútua.
A dor que persiste no tempo
O sentimento de dor e incredulidade é inalterado para dom Tomo Vukšić desde que tomou conhecimento do massacre. Em suas palavras, “por um lado, há a incredulidade e o desconcerto diante da impotência da comunidade internacional em impedir uma tragédia horripilante como aquela e, por outro, há a oração pelos mortos e a solidariedade humana e cristã com os que sofreram”. O arcebispo enfatiza que, apesar de os anos terem passado, as cicatrizes do massacre e as guerras que ainda ocorrem no mundo evidenciam uma dura realidade: “como se o mundo não tivesse aprendido nada com as tragédias anteriores”.
A tragédia e suas lições não aprendidas
Dom Tomo refere-se especificamente ao massacre de Srebrenica como um evento que não ensinou suficientemente à Europa e à comunidade internacional. “A Europa é uma realidade complexa, que não se resume à União Europeia. Contudo, pode-se afirmar que Srebrenica não ensinou muito, assim como o conflito em Ruanda e as guerras em outras nações”, afirma o arcebispo. Essa percepção reforça a ideia de que as tragédias humanas frequentemente se repetem, sem que as lições sejam reconhecidas ou aplicadas.
Um processo longo e necessário
Comemorando trinta anos do massacre, dom Vukšić destaca a importância do processo de pacificação da memória coletiva. Ele afirma que esse é um “processo longo” que requer paciência e perseverança. “É o pressuposto do perdão e da reconciliação que, junto com a justiça, são os fundamentos da paz justa e duradoura”, explica. Embora a Igreja tenha alcançado alguns resultados positivos, o arcebispo enfatiza que ainda há muito a fazer. Ele cita a Doutrina Social da Igreja como uma importante aliada nesse percurso.
Promovendo a reconciliação através do diálogo
Para dom Vukšić, a verdadeira reconciliação na Bósnia e Herzegovina só será alcançada através da promoção contínua do diálogo, especialmente entre diferentes religiões. “A Igreja local tem se esforçado muito nesse sentido, organizando programas que reúnem pessoas de diferentes fés”, assegura. Ele destaca iniciativas como o mestrado na Faculdade de Teologia, onde estudantes de diferentes religiões convivem e aprendem juntos, e a inclusão do ensino da religião ortodoxa e muçulmana nas escolas católicas.
A importância de lembrar para não esquecer
A cura das feridas ainda abertas exige uma compreensão profunda da diversidade religiosa da Bósnia, onde muçulmanos, ortodoxos e católicos compartilham a mesma terra, mas também um passado doloroso. “Cada comunidade sofreu durante a guerra, e não podemos esquecer nenhuma vítima”, ressalta dom Vukšić. O arcebispo adverte que o dever da memória é mais urgente do que nunca, especialmente em um contexto político que apresenta novos desafios e incertezas. Ele expressa preocupação com a retórica de alguns líderes políticos que, segundo ele, provocam um clima de insegurança na população.
Um clamor por paz e justiça
Para evitar que erros do passado se repitam, dom Vukšić apela à necessidade de diálogo constante. “O massacre de Srebrenica ainda hoje serve como um aviso sobre as consequências da falta de entendimento”, diz o arcebispo. Ele enfatiza que, diante de tantas perdas e dor, é fundamental expressar solidariedade às vítimas e lembrar que o papel das instituições e leis é garantir o cumprimento da justiça.
Assim, trinta anos após aquele trágico evento, a luta por um futuro de paz e compreensão continua viva, sustentada pela esperança de que o diálogo inter-religioso e o reconhecimento da dor destes eventos podem guiar o caminho para a reconciliação na Bósnia e Herzegovina.