Neste ano, o massacre de Srebrenica completa trinta anos, relembrando as mais de oito mil vidas ceifadas pelas forças sérvias da Bósnia, sob o comando do general Ratko Mladić, agora cumprindo pena perpétua em Haia. O Dia Internacional da Memória do Genocídio de Srebrenica foi estabelecido pela Assembleia das Nações Unidas em 2024, refletindo a necessidade urgente de reconhecer e aprender com este trágico episódio da história.
A tragédia de Srebrenica
Durante a guerra dos Bálcãs, entre 1992 e 1995, a cidade de Srebrenica tornou-se o cenário de um dos genocídios mais sombrios da Europa. Mais de 8.300 muçulmanos bósnios foram brutalmente assassinados, e muitos outros desapareceram sem deixar vestígios. A dificuldade em lidar com essas memórias persiste, e, por trinta anos, as famílias lutarão para enterrar adequadamente seus entes queridos. No último dia 11 de julho, restos mortais de sete vítimas foram sepultados no memorial de Potočari, somando-se aos cerca de 7.000 já identificados.
A dor dos sobreviventes
A dor das famílias afetadas, muitas delas representadas pelas chamadas “mães de Srebrenica”, continua a ecoar nas comunidades ao longo do Vale do Drina. A novela trágica de Srebrenica não é apenas uma história de horror, mas uma realidade viva que ainda marca o cotidiano. As guerras que se seguiram à dissolução da antiga Iugoslávia trouxeram um legado de divisão e desconfiança que persiste. Os combates, que começaram em 1992 com a independência da Bósnia, envolviam múltiplos grupos étnicos e foram alimentados por questões de nacionalismo exacerbado. A limpeza étnica perpetrada pelos sérvios-bósnios visava garantir a hegemonia sobre a região, o que culminou em massacres massivos, destruição de povoados e expulsões.
Responsabilidades internacionais
A tragédia de Srebrenica expõe as falhas da comunidade internacional em proteger os civis em zonas de conflito. Em julho de 1995, apesar de Srebrenica ter sido declarada uma “zona segura” pela ONU, as tropas sérvias-bósnias conseguiram invadir a cidade, resultando em um massacre horrível. As tropas holandesas, que estavam lá como Capacetes Azuis, foram criticadas por sua falta de preparo e incapacidade de proteger a população. Em 2017, um tribunal holandês decidiu que o Estado era “parcialmente responsável” pelas mortes de muitos muçulmanos, após forçá-los a deixar o abrigo. No entanto, os esforços do governo holandês em 2021, ao indenizar veteranos do batalhão Dutchbat III, refletem a complexidade e a dor dos eventos que ocorreram naquela época.
Desafios contemporâneos e o futuro dos Bálcãs
Atualmente, os Bálcãs permanecem em um estado de dúvida, dividido entre o peso do passado e a incerteza do futuro. A busca pela adesão à União Europeia é um desafio constante para as nações da antiga Iugoslávia. Enquanto a Eslovênia e a Croácia avançaram, a Bósnia e Herzegovina ainda enfrenta desafios crise política interna e nacionalismos exacerbados. O sistema de governo, estabelecido pelos Acordos de Dayton, que dividiu o país em duas entidades, tem sido considerado um entrave à formação de um estado democrático e funcional.
Retórica negacionista e a necessidade de reconciliação
O contexto atual é marcado por uma retórica nacionalista na República Sérvia, onde a negação do genocídio de Srebrenica se tornou uma questão controversa. Desde a recente aprovação do Dia Internacional de Memória do Genocídio de Srebrenica, a oposição de líderes políticos e a divisão entre Banja Luka e Sarajevo evidências os desafios em construir uma narrativa comum sobre o passado. O negacionismo ainda permeia a liderança sérvia-bósnia, mas há esforços em Belgrado para confrontar e superar a história. A visita do ex-primeiro-ministro Aleksandar Vučić ao memorial de Potočari em 2015 foi um passo simbólico, embora cercado de tensões e oposição.
Lições do passado e a esperança de um futuro melhor
As palavras de São João Paulo II, que visitou Sarajevo em 1997, ressoam até hoje: a preservação da diversidade é essencial para a construção de uma Bósnia e Herzegovina democrática. Para as novas gerações que não viveram diretamente a dor das guerras, a memória de Srebrenica é um importante legado a ser honrado. A esperança é que, ao lembrar e refletir sobre os horrores do passado, as futuras gerações possam traçar um caminho rumo à reconciliação e à paz, superando o que Papa Wojtyła chamou de “um dos capítulos mais tristes da história da Europa”.
A memória de Srebrenica é um chamado contínuo à reflexão, para que nunca mais se repitam as atrocidades do passado.