Querido Erik,
Você se lembra de mim? Sou aquela garota de Prescott, Arizona — a menina solitária que começou a te escrever aos 16 anos. Já se passaram mais de 30 anos desde a última vez que conversamos, então não vou reclamar se você não se recordar de mim. Aposto que recebia muitas cartas, mas tenho a esperança de que fui sua favorita, certo?
Durante esses três décadas, sempre evitei falar de você em conversas casuais — seja por notícias do seu caso ou por documentários recentes. Me senti como alguém que carregava um segredo, tentando proteger uma imagem de mãe suburbana que joga tênis, organiza eventos beneficentes e ajuda na escola dos filhos. Mas, recentemente, uma lembrança voltou com força: minha curiosidade e compaixão por você ainda permanecem.
A amizade inesperada e o impacto
Quando, recentemente, assisti ao seu documentário na Netflix, senti uma mistura de emoções. Apesar de meu desejo de evitá-lo, percebi o quanto sua história — marcada por abuso e sofrimento — tocou minha sensibilidade. A tragédia que vocês viveram, você e seu irmão Lyle, foi dolorosa, e o que mais me chamou atenção foi a sensação de que aquela amizade antiga ainda tinha algo a dizer.
Você parece estar presente em quase tudo que faço hoje. É como se os anos 90 ressurgissem, com seu rosto nas capas de revistas e seu nome nas notícias. Lembro-me de uma edição da revista People, na fila do supermercado, onde você e Lyle estavam na capa. Naquele instante, devorei cada palavra e senti uma empatia quase infantil por você, um garoto de apenas três anos mais novo que eu, preso na condenação, injustamente — ou assim o via na minha juventude.
Uma conexão de adolescência e suas complexidades
Nossa amizade começou com uma carta que enviei por impulso, após meus pais discutirem e eu me sentir isolada. A troca de cartas, mesmo que breve, foi intensa — compartilhávamos nossas vidas de adolescentes, nossos sonhos e desejos. Você, do outro lado, parecia tão vulnerável, tão cheio de conflitos, que minha empatia cresceu.
Quando consegui visitar você na prisão, aos 17 anos, foi uma das experiências mais marcantes da minha vida. Você parecia frágil, pálido, mas gentil. Nosso encontro, ainda que breve, reforçou a ideia de uma conexão genuína, além do papel e das palavras escritas.
O fim da amizade e as dúvidas que persistem
Por que, então, parei de te ligar e de responder às suas cartas? A verdade é que, com o tempo, o medo e a confusão tomaram conta de mim — um sentimento que muitos jovens podem entender, mas que também deixou uma marca duradoura. Quando você me disse que me amava, senti medo, e, em poucos dias, desapareci das suas vidas.
Hoje, ao refletir, percebo que minha história com você é uma mistura de curiosidade, compaixão e uma tentativa de entender o inexplicável. Apesar de tudo, sigo pensando que, naquela época, minha amizade foi uma tentativa de encontrar sentido na dor, numa fase em que ainda buscava minha própria identidade.
O que desejo que você saiba agora
Ao acompanhar sua trajetória e reconhecer as mudanças pelas quais passou, quero que saiba que minha atitude foi movida por empatia, apesar das controvérsias. Desejo-lhe que, ao sair da prisão, encontre a paz, a reconciliação consigo mesmo e com o que causou.
Que suas ações futuras, como o trabalho com outros internos e sobreviventes, possam refletir essa busca de redenção. Você, como pessoa, merece uma chance de recomeço, assim como eu, aos 43 anos, ainda busco entender a complexidade dessa amizade improvável.
Perspectivas de recomeço e reflexão final
Hoje, vejo que nem tudo na vida tem uma explicação clara, e muitas vezes, carregamos histórias que nunca terão fim definitivo. Escrever essa carta é uma forma de criar uma ponte imaginária para a minha própria paz interior, uma despedida simbólica dessa amizade que nasceu na juventude e, de alguma forma, se estendeu por toda uma vida.
Que você possa construir um caminho de paz, e que, um dia, possamos entender plenamente o que nos une — ou o que nos separa — nesta jornada humana.
Com esperança e reflexão,
Jen
Jennifer Sullivan Beebe é escritora e mora em Chevy Chase, Maryland. Ela escreve ensaios pessoais sobre maternidade, feminilidade e os dilemas do cotidiano. Quando não está escrevendo, gosta de jogar tênis, fazer caminhadas e praticar yoga.
Esta carta foi originalmente publicada na HuffPost em junho de 2025. Leia a publicação original.
tags: amizade, reconciliação, reflexão, casos criminais, perdão