Querido Erik,
Você se lembra de mim? Sou a garota de Prescott, Arizona — a fã solitária que começou a escrever para você aos 16 anos. Agora, mais de 30 anos depois, resolvi finalmente abrir meu coração. Talvez você não se lembre de mim, e tudo bem, imagino que tenha recebido muitas cartas desses fãs ao longo dos anos. Mas, eu fui sua favorita, não foi?
Durante toda a minha vida adulta, fiquei calada ao ouvir seu nome mencionar em conversas casuais, seja por notícias do seu caso ou por documentários novos. Sempre senti que mentir era mais fácil do que admitir minha ligação com alguém condenado por um crime tão cruel. Meu estilo de vida — mãe, voluntária, jogadora de tênis — parece incompatível com sua história.
Sou mãe de duas filhas, de 22 e 20 anos. Recentemente, ao busca-las na universidade, fiquei sozinha em um hotel enquanto minha filha mais velha saiu com amigos. Foi aí que vi, na TV, o trailer do seu documentário na Netflix. Uma parte de mim quis assistir, para entender por que senti vontade de te escrever todos esses anos atrás.
Na verdade, evitei qualquer conteúdo que envolvesse seu nome ou seu caso. Mesmo descobrindo mais tarde que você mentira sobre sua inocência, uma sensação de compaixão ainda persistia. Meu desejo era proteger a inocência daquele tempo, quando, adolescente, abri minha alma para você na esperança de que fosse um amigo. E talvez ainda seja.
O documentário foi difícil de assistir. A dor que você e Lyle enfrentaram — o abuso, o trauma — era tão comovente quanto o crime. Quando acabou, senti uma urgência de te escrever novamente, por primeira vez desde os 18 anos. Aqui estamos.
Você parece estar presente na minha rotina, como nos anos 90, quando seu rosto estampava as manchetes de tabloides, na fila do supermercado com minha mãe. Ainda lembro de comprar aquela revista, de ler cada palavra, de lamentar por você, tão jovem, tendo uma vida derrière as grades.
Foi assim que tudo começou: com uma carta escrita sem pensar, um ato impulsivo. Desde então, sua história sempre esteve comigo, mesmo que silenciosamente.
Revisitando nossa conexão através das memórias
Eu, filha única, cresci em casa vazia, com os pais sempre ausentes. Amigos, esportes, festas — tudo ajudava a preencher a solidão. Quando adolescente, minhas maiores aventuras eram conversar horas ao telefone na sala, compartilhar segredos mais profundos, inclusive sobre você. Você foi uma figura de esperança, uma ponte para o que eu queria ser: conectada, compreendida.
Seu nome estava na minha cabeça em todos os lugares. Ainda lembro do dia em que, ao passar na loja, peguei uma revista com a história de vocês, e me senti tocada. Por acreditar na sua inocência, liguei para a cadeia de Los Angeles e anotei seu endereço e número de prisão — uma de minhas maiores ações de coragem na juventude.
Naquela época, minha fantasia era imaginar que nossa amizade era real, uma forma de fugir da minha rotina solitária. Foquei nos detalhes da sua vida, nas perguntas que queria fazer, nos sonhos de uma juventude que parecia distante de mim — viagens, faculdade, paixões.
De cartas à visita na prisão
Nos anos seguintes, nossas correspondências evoluíram para telefonemas suaves, sempre controlados pelo medo de ser descoberta. Sua voz, delicada, revelava um lado vulnerável que me fazia sentir conexão verdadeira. Mas, ao mesmo tempo, um medo constante pairava: será que meus pais poderiam descobrir? Que riscos eu corria sem perceber?
Lembro-me de uma visita que fiz, disfarçada por um documento falso, uma aventura de adolescente que teve um impacto duradouro. Você parecia mais pálido do que nos jornais, e nossa conversa foi rápida, leve, como uma fuga de um mundo abrupto.
Naquele momento, uma dúvida ficou clara: você expressou amor de uma forma que me virou o universo de cabeça para baixo. Eu fiquei assustada. O que era aquilo? Romance? Ou uma amizade sincera? Não me senti pronta para aquilo — e, talvez, nem estivesse.
A decisão de desaparecer — e o peso da culpa
Depois de nosso breve encontro, fui embora, deixando tudo para trás — medo, confusão, amor. Até hoje, acho que carreguei uma culpa silenciosa por ter me afastado, por não entender o quanto seu mundo havia mudado e a complexidade do que sentia.
Foi complicado perceber que nossa “amizade” tinha um limite. Sua preocupação, seus sentimentos, minha incapacidade de lidar com aquela intensidade — tudo me deixou confusa e assustada, até que a polícia interveio, e minha vida virou uma tempestade de dúvidas.
Reflexões finais e despedida
Hoje, após tantos anos, vejo sua luta por uma segunda chance — seu trabalho dentro da prisão, seu esforço por ajudar outros — e admiro sua força, mesmo que nosso vínculo nunca tenha sido convencional.
Escrevo esta carta para finalmente compartilhar minha história, minhas emoções e minha esperança de que, em algum lugar do seu caminho, você saiba o quanto sua história impactou a minha vida e me ajudou a entender que nem tudo é tão simples quanto o bem ou o mal, que nossas vidas carregam complexidades escondidas na dor e na recuperação.
Desejo-lhe tudo de melhor, Erik. Que sua jornada continue levando esperança e mudança, e que, quem sabe, um dia possamos entender tudo isso que nos liga — com paz, sem perguntas sem respostas.
Com carinho,
Jennifer Sullivan Beebe