No atual cenário político brasileiro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva busca intensificar seu apelo junto ao eleitorado de baixa renda. Em um movimento reminiscentemente semelhante à crise do mensalão em 2005, Lula adota um discurso cada vez mais focado na polarização entre “ricos e pobres” e critica o que chama de “andar de cima” da sociedade. Essa comunicação do governo tem como objetivo associar sua imagem a um público que foi fundamental em sua eleição em 2022, ao mesmo tempo em que tenta usar a pressão social para driblar impasses na articulação política.
A polarização como estratégia política
Especialistas em comunicação política indicam que a eficácia desse discurso de “ricos contra pobres” ainda é um assunto debatido. Para alguns estrategistas, essa abordagem pode continuar a mobilizar a militância petista e a atrair a atenção dos eleitores se acompanhada de ações concretas para a mudança na economia. Contudo, muitos ressaltam que a evolução da imagem de Lula e do Partido dos Trabalhadores (PT) nas últimas décadas pode obscurecer a mensagem, tornando necessário que ela seja respaldada por melhorias tangíveis.
Recentemente, Lula defendeu a criação de uma nova alíquota do Imposto de Renda para pessoas com rendimentos superiores a R$ 50 mil mensais. Em uma visita à Bahia, o presidente até levantou um cartaz enfatizando a necessidade de “taxação dos super-ricos”. Essa proposta, segundo uma pesquisa do Datafolha, é bem recebida pela população, com 76% dos entrevistados apoiando-a, e 78% entre os mais pobres.
Os riscos da retórica sem ação
Basta lembrar das ideias de justiça social: apesar de continuar a mobilizar as camadas populares, a retórica por si só sem resultados concretos pode gerar ressentimento. Marcos Carvalho, um dos marqueteiros da campanha digital de Bolsonaro em 2018, adverte que se o governo se posicionar contra os “ricos”, mas for percebido como um estado que “cobra muito e entrega pouco”, isso pode confundir a população e desgastar a credibilidade do discurso.
Além disso, com a recente derrubada do decreto que aumentava o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), o PT apelou para estratégias de comunicação focadas em responsabilizar o Congresso, especialmente o presidente da Câmara, Hugo Motta, pelos bloqueios em propostas que beneficiariam a população de menor renda.
Relação com o Congresso e os desafios políticos
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, complementa essa narrativa ao questionar se o Congresso deseja “prejudicar a parcela mais pobre” do país. Ele enfatizou o risco de retaliação dos parlamentares à medida que o governo busca apoio judicial para implementar um aumento das alíquotas do IOF. Essa tentativa de enquadrar o Congresso, afirmando que o Centrão não está contribuindo, pode ajudar a consolidar a imagem de Lula como vítima, embora analistas observem que sua credibilidade não é a mesma de outros tempos.
Outros especialistas, como Marcello Faulhaber, enxergam uma possibilidade de sucesso nas novas táticas do discurso petista como um “instrumento poderoso” visando as eleições de 2026. Ele aponta que esse discurso aguerrido é similar ao de Lula em sua primeira candidatura presidencial em 1989.
Reativando o desejo de Lula junto aos eleitores mais pobres
Para muitos, o desafio de Lula é manter sua conexão com o eleitorado mais pobre em um momento em que sua popularidade nesta faixa demográfica está em declínio. Pesquisas recentes mostram que a avaliação positiva de seu governo caiu entre os mais pobres, com apenas 32% considerando a administração ótima ou boa em junho, em comparação com 44% no final de 2022.
Em um contexto onde pesquisas indicam uma preferências por empregos informais, uma parte significativa da população que não quer se engajar em uma luta de classes, mas sim empreender e prosperar, pode não ressoar com o discurso de polarização. Isso sugere uma necessidade de repensar estratégias que alinhavam o partido aos interesses e aspirações econômicas do eleitorado.
Desta forma, a narrativa de “nós contra eles” que outrora houve uma forte adesão pode acabar afastando Lula das suas bases, já que muitos percebem essa divisão de forma diferente, concentrando-se em conquistas e estabilidade econômica. As questões culturais e a defesa de valores progressistas têm dominado o cenário, o que pode prejudicar a conexão do Lula com o público que ele mira.
Por fim, enquanto o governo tenta reconquistar a confiança dos mais pobres, muito dependerá do desenvolvimento de ações efetivas que realmente melhorem a vida desta parcela da população, pois um discurso, por mais poderoso que seja, pode não ser suficiente em um momento de altas expectativas e necessidades diversas.