O clima amistoso entre o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a gestão paulista de Tarcísio de Freitas (Republicanos) durou menos de três meses. A parceria, que visa a construção do túnel que ligará as cidades de Santos e Guarujá, no Litoral Sul de São Paulo, enfrenta tensões crescentes. Embora um evento cordial tenha marcado o lançamento do edital no dia 27 de fevereiro, já surgem reclamações sobre o não cumprimento de acordos relacionados à empreitada.
Disputas e ofícios revelam descontentamento
Duas comunicações oficiais obtidas pelo GLOBO revelam que as autoridades federais expressaram surpresa com decisões consideradas unilaterais pelo governo de São Paulo. Um dos ofícios foi enviado pelo ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, enquanto o outro foi remetido por Anderson Pomini, presidente da Autoridade Portuária de Santos (APS). Ambos os documentos indicam uma preocupação com a transparência e o cumprimento dos acordos estabelecidos na parceria.
Um dos ofícios destaca uma resolução publicada no Diário Oficial do Estado em 30 de abril, que designou nove membros para uma comissão responsável por analisar o pregão. Essa medida foi interpretada como um “atropelo” à criação anterior de um grupo misto de licitação, composto por representantes da União, APS, Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) e do Estado de São Paulo. O ministro Costa Filho também destacou que tal decisão surpreendeu os demais envolvidos no Acordo de Cooperação Técnica.
Republicação do edital e aumento de custos
Vinte dias após a primeira queixa, Pomini enviou um segundo documento ao governador Tarcísio. Desta vez, a reclamação era sobre a republicação do edital em 9 de junho, que elevou o custo da obra em R$ 800 milhões, totalizando R$ 6,8 bilhões. O novo edital incluiu questões técnicas que, segundo Pomini, não haviam sido previamente acordadas.
“A ausência de consulta ou comunicação prévia aos participantes quanto à republicação do edital representa um desvio do modelo de governança acordado entre as instituições envolvidas”, afirmou Pomini, que também destacou que os ofícios enviados não foram respondidos.
Motivações políticas no horizonte eleitoral
No contexto político, um membro do governo Lula acredita que a aproximação das eleições, em 2026, influenciou a decisão do governador Tarcísio em tomar medidas unilaterais. “Tarcísio quer bater o martelo sozinho, pois estamos em ano pré-eleitoral, mas não quer abrir mão do recurso federal”, afirmou. Essa postura pode acarretar questionamentos judiciais por parte das empresas que forem desclassificadas no processo licitatório, uma vez que o acordo de cooperação tem respaldo legal.
A gestão Tarcísio, por sua vez, refutou as acusações e reafirmou o compromisso com a parceria ao afirmar que “o Governo de São Paulo reafirma o alinhamento e a parceria com o Governo Federal para a viabilização do Túnel Imerso Santos-Guarujá, uma prioridade comum”. No entanto, não respondeu diretamente às questões levantadas nos ofícios.
Expectativas sobre a obra
Apesar das desavenças, auxiliares de Tarcísio minimizam as disputas e afirmam que tudo será resolvido por meio de “diplomacia”. E garantem que a construção do túnel, que promete reduzir o tempo de travessia entre as duas cidades para cerca de dois minutos, terá contribuições de todos os envolvidos no projeto, que é uma prioridade há quase um século para a região.
O túnel, que terá 1,5 quilômetros de extensão, saindo da região de Vicente de Carvalho, no Guarujá, até o bairro Macuco, em Santos, incluirá uma ciclovia e faixas de rolamento para veículos de diferentes tipos. O leilão para a contratação da concessionária responsável pela obra está previsto para 1º de agosto. A empresa vencedora terá a responsabilidade de tocar a obra e operar o túnel pelos próximos 30 anos, sendo selecionada com base no maior desconto sobre o valor pago pelo governo.
Com planejamentos complexos e relações políticas cada vez mais tensionadas, o projeto do túnel Santos-Guarujá se destaca como um dos mais relevantes do Programa de Aceleração ao Crescimento (PAC) do governo federal. A construção não apenas promete melhorar a mobilidade na região, mas também se tornou um reflexo das dinâmicas políticas que cercam o atual cenário brasileiro.