No próximo domingo (28), o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+ será celebrado, mas para muitos idosos dessa comunidade no Brasil, a data traz à tona uma realidade de desafios e invisibilidade. Embora a data represente a diversidade e o orgulho, muitos membros da população LGBT+ que já estão na terceira idade se sentem à margem deste contexto, enfrentando questões como solidão, abandono familiar e a falta de acesso a serviços de saúde adequados.
Envelhecer na comunidade LGBT+
O envelhecimento possui um impacto significativo sobre as vidas desses indivíduos. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 2,9 milhões de pessoas se identificam como homossexuais ou bissexuais, das quais apenas 71 mil são idosos. No entanto, esses números não incluem a população trans e travesti, gerando um apagamento das realidades enfrentadas por esses grupos. Além disso, muitos relatam uma volta ao “armário” devido ao preconceito e à falta de aceitação por parte de seus familiares.
Casadas há mais de 40 anos, Ana Beatriz Ruppelt, de 69 anos, e Maria Tereza Cebalos Aguilar, de 66, exemplificam os desafios enfrentados na velhice. Elas vivem com 18 cachorros em uma casa afastada do centro de Itapevi, São Paulo. Ana Beatriz, que se identifica como mulher trans e lésbica, relata que seu caminho até a aceitação pessoal foi longo e repleto de dificuldades, especialmente por ter crescido em um ambiente conservador. Além disso, ela aponta para o isolamento social provocados pelo abandono familiar e a transfobia que enfrentou de seus próprios filhos.
Histórias de superação e desafios
Dora Cudignola, de 72 anos e presidente da ONG Eternamente Sou, que apoia idosos LGBT+, compartilha sua trajetória, que incluiu um casamento com um homem antes de descobrir seu amor por mulheres. A professora conta que seu primeiro relacionamento homossexual foi libertador, apesar de ter enfrentado violência. Seu amor verdadeiro surgiu quando conheceu Silvia em um chat online, mas sua vida mudou drasticamente após a morte de Silvia, que a deixou com um grande vazio. O acolhimento da comunidade escolar após sua perda foi fundamental para que ela decidisse viver sua verdade sem medo do julgamento.
Ailton de Almeida, conhecido como Sissi Girl, é uma drag queen com 30 anos de carreira. Agora aos 55, ele se preocupa com o futuro e a solidão, refletindo sobre quem cuidará dele na velhice. “Quem vai cuidar de mim na velhice?”, questiona Ailton, enfatizando a necessidade de uma rede de apoio, especialmente para a comunidade LGBT+ que frequentemente enfrenta o isolamento social. Ele ressalta que a idade traz consigo não só desafios físicos, mas também uma preocupação constante sobre a aceitação e a continuidade de suas carreiras artísticas.
A vida como um desafio constante
Os desafios que os idosos LGBT+ enfrentam são complexos e multifacetados. A psicóloga Jaqueline Gomes de Jesus observa que, muitas vezes, as necessidades desses indivíduos são ignoradas nas políticas públicas. A falta de espaços seguros, como asilos que respeitem as identidades de gênero, e a invisibilidade dessas questões contribuem para um estado de vulnerabilidade crescente. Muitos sentem que precisam voltar para suas famílias biológicas, onde, muitas vezes, não são aceitos.
O médico geriatra Milton Crenitte aponta que as taxas de depressão e ansiedade são elevadas entre idosos LGBT+, especialmente entre aqueles que enfrentam realidade de discriminação. Ele defende a implementação efetiva da Política Nacional de Saúde Integral da População LGBT e a inclusão de educação sobre diversidade nos currículos de formação na área da saúde.
O futuro e a esperança
Apesar das dificuldades, muitos idosos LGBT+ continuam lutando por dignidade e aceitação. Ana Beatriz, embora crítica da militância que alega não dar espaço para os idosos, sonha com um futuro onde possa continuar vivendo plenamente sua identidade. Historicamente, a comunidade LGBT+ enfrentou repressão e violência, mas a visibilidade que o Dia Internacional do Orgulho traz também oferece uma oportunidade para reivindicar direitos e reconhecimento.
É fundamental que a sociedade como um todo comece a acolher todas as idades dentro da comunidade LGBT+, reconhecendo suas histórias e desafios, garantindo assim um envelhecimento digno e respeitado, longe da solidão e do abandono.