No contexto do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, um relatório final sobre a apuração da chamada “Abin paralela” trouxe à tona tentativas de obstrução por parte de Alessandro Moretti, ex-número 2 da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). O documento expõe a solicitação de Moretti a colegas para coletar informações que servissem contra o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues. Em meio a essa disputa interna, surgiram mensagens interceptadas que demonstram uma mobilização preocupante de poder dentro das instituições de segurança do Brasil.
Tentativa de desestabilização interna
De acordo com as apurações da Polícia Federal (PF), Moretti buscava evidências de que Rodrigues estava “incentivando” uma greve dentro da polícia federal no final de 2023, período marcado por tensões salariais entre os policiais. Em sua comunicação, ele expressa a necessidade de provas concretas que pudessem ser utilizadas contra o chefe da PF, revelando assim um viés político nas ações dentro da Abin.
“Alguém me consegue algo concreto de que o Anão (referência a Rodrigues) está incentivando a greve”, questionava Moretti, em busca de uma “mensagem” ou “fala” que pudesse embasar um ataque político contra Rodrigues. Essa manobra foi interpretada pela PF como uma tentativa de dificultar o andamento das investigações que envolviam a Abin e os possíveis desvíos de funções dentro da agência.
A reação da PF e as indagações de obstrução de justiça
Moretti e seu superior, Luiz Fernando Corrêa, acabaram indiciados por obstrução de Justiça. Segundo o relatório da PF, ambos tentaram desacreditar as investigações, tentando rotulá-las como perseguições de cunho político. Além disso, Moretti também é acusado de manipular informações para descredibilizar as apurações que miravam a gestão anterior da Abin, sob a direção do deputado federal Alexandre Ramagem, designado por Jair Bolsonaro.
Outra informação crucial levantada pela PF refere-se a uma imagem compartilhada por Moretti que associava Andrei Rodrigues a Anderson Torres, ex-ministro da Justiça de Bolsonaro. A representação visual foi manipulada, com cortes que buscavam colocar o atual chefe da PF no mesmo contexto que Torres, acirrando as desavenças entre os dois.
Impacto do uso irregular do sistema FirstMile
O uso da plataforma FirstMile, que permitia monitoramento sem mandado judicial, foi um dos pontos críticos que originaram o inquérito da PF. Moretti, que inicialmente mencionou ter iniciado apurações internas sobre essa ferramenta, acabou sendo exonerado em meio ao avanço das investigações, um reflexo do clima tenso no governo Lula quanto à segurança e integridade das instituições.
Cabe destacar que, internamente, Moretti já enfrentava críticas desde sua nomeação, devido à sua proximidade com Anderson Torres. Ele havia ocupado posições de destaque na gestão de segurança do Distrito Federal onde Torres foi secretário-executivo.
Continuidades e repercussões políticas
Luiz Fernando Corrêa, responsável pela nomeação de Moretti, mantém seu posto com o apoio do ministro da Casa Civil, Rui Costa. A atual gestão da Abin tem enfrentado acusações de ter tentado criar situações políticas que buscavam embaraçar o Ministro da Justiça, Flávio Dino, especialmente quando ainda estava envolvido nas investigações sobre o uso indevido do sistema FirstMile.
A PF trouxe à luz um diálogo entre Moretti e Marcelo Furtado, que estava à frente do Departamento de Operações, onde Furtado analisa um contrato de ferramenta de inteligência do governo do Maranhão que poderia relacionar-se com a utilização do sistema investigado. De acordo com a PF, o cerne das investigações está em comprovar as tentativas de sabotagem e manipulação por parte de membros da Abin, indo para além das simples interlocuções entre os envolvidos.
Buscando resposta, tanto a Abin quanto Flávio Dino optaram por não se pronunciar sobre os últimos desdobramentos. As investigações seguem em curso, e é evidente que o clima de suspeita e tensão nas agências de segurança do Brasil deve continuar a influenciar a política, especialmente em um período de transição de governo e de reformas nas instituições.