Durante o último sábado, um dos encontros mais aguardados do Festival Internacional de Cinema de Provincetown aconteceu: a conversa entre os cineastas John Waters e Ari Aster. Waters, um ícone da quebra de barreiras no cinema, e Aster, conhecido por seus filmes perturbadores e complexos, uniram-se num diálogo que mesclou humor e crítica ao estado atual da indústria cinematográfica.
Encontro de Grandes Nomess
Os dois diretores, que se conheceram anos atrás em uma festa na casa do escritor David Sedaris, iniciaram o bate-papo com uma boa dose de autocrítica e humor. Aster, que recebeu o prêmio “Filmmaker on the Edge” da festividade, viu suas obras posteriores à aclamada Hereditary como não tão bem-sucedidas. “Desde então, tudo tem sido uma queda”, brincou o diretor. “Eu achava que seria sempre assim.” Waters, por sua vez, aproveitou para relembrar algumas das críticas ferozes que recebeu, como a de Janet Maslin, que se referiu ao seu filme Desperate Living como “um filme inutilmente feio”.
A Crítica e o Impacto do Cinema
Ambos os cineastas expressaram uma sensação de desânimo sobre o estado da indústria cinematográfica. Waters, que é considerado um santo padroeiro de cineastas ousados, mencionou que a “indústria do cinema, como a conheço, acabou”. Aster concordou, destacando a dificuldade atual em se fazer filmes que ressoem com o público. “A cultura no geral está se sentindo horrível”, disse ele. “Mas sou sortudo por estar fazendo os filmes que quero fazer.” Para Aster, a frustração é traduzida em suas obras. Seu próximo longa, Eddington, se passa em 2020 e trata de temas como paranoia e teorias da conspiração, com um xerife e o prefeito de uma pequena cidade do Novo México se confrontando em um cenário de desconfiança.
A crítica de Waters a Eddington foi contundente, ressaltando a falta de heróis na narrativa: “O que eu gosto tanto é que não tem como torcer por alguém. Tanto a esquerda quanto a direita são horríveis. Será que podemos sentir nostalgia da Covid?” Aster, no entanto, foi cauteloso quanto à nostalgia, admitindo que não sabia até que ponto o filme realmente a evocava.
Desafios Criativos e a Influência da Crítica
Uma das questões discutidas foi a influência da crítica nas produções cinematográficas. Waters comentou que antes, uma crítica positiva no The New York Times era um indicativo de sucesso, enquanto hoje isso parece ter mudado. “Sinto falta do poder dos críticos de certa forma”, disse ele, refletindo sobre como uma crítica negativa ainda pode prejudicar severamente uma produção, enquanto uma positiva pode não fazer diferença.
Os dois diretores também expressaram sua frustração com as pressões da indústria em direção ao compromisso. Waters avaliou que a A24, a distribuidora de Aster, é uma versão moderna da Miramax de Harvey Weinstein, mas sem as polêmicas que cercavam o ex-executivo. Aster descreveu o processo de edição de seus filmes como um constante “grande conflito”, onde o foco está em diminuir a duração das suas obras, e não na qualidade do conteúdo.
Uma Admiração Mútua
A conversa terminou de forma calorosa, com Aster expressando sua admiração por Waters e reconhecendo a influência que suas obras tiveram em sua carreira. “É uma honra receber isso de você, John”, disse Aster ao aceitar o prêmio. “Você é um dos meus heróis, e seus filmes foram uma verdadeira estrela do norte para mim enquanto eu crescia.”
O encontro entre Waters e Aster não foi apenas uma conversa sobre cinema, mas um diálogo apaixonado sobre arte, autenticidade e os desafios de ser um cineasta em um mundo que frequentemente busca o compromisso em detrimento da visão artística.
Imagem principal: Ari Aster e John Waters. MovieMaker.