Um recente levantamento do jornal O GLOBO revelou que a aposentadoria compulsória de juízes no Brasil tem um impacto significativo nas finanças públicas, com custos anuais de aproximadamente R$ 41 milhões. Desde 2008, 119 magistrados foram afastados compulsoriamente, conforme dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e dos tribunais de origem. Este estudo destaca não apenas o montante gerado aos cofres públicos, mas também as questões éticas e jurídicas por trás dessa prática.
O que é a aposentadoria compulsória?
A aposentadoria compulsória é considerada a sanção máxima prevista pela Lei Orgânica da Magistratura Nacional para juízes que cometem infrações disciplinares. Embora implique a exclusão do magistrado do exercício de suas funções, é importante entender que essa penalidade não resulta na interrupção dos salários. Os juízes aposentados compulsoriamente continuam a receber proventos vitalícios, cujo cálculo baseia-se no tempo de contribuição e é limitado ao teto do subsídio da magistratura, atualmente fixado em R$ 39,2 mil mensais.
Como é feito o cálculo dos proventos?
O critério para calcular os proventos é simples: o tempo de contribuição do magistrado é dividido pelo período mínimo de 30 anos e, em seguida, multiplicado pelo teto do subsídio. Embora continuem a receber seus salários, os magistrados afastados não recebem adicionais conhecidos como “penduricalhos”, que incluem auxílio-moradia, gratificações ou verbas indenizatórias.
Por exemplo, o juiz federal Marcelo Bretas, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), é o mais recente magistrado a ser punido, e seu benefício mensal será de R$ 36,7 mil, considerando seus 28 anos de contribuição. Os valores dos proventos para os demais magistrados punidos variam entre R$ 15 mil — para aqueles com carreiras interrompidas precocemente — e valores próximos ao teto, dependendo do tempo restante até a aposentadoria regular. A média dos proventos entre os magistrados punidos é de R$ 28,5 mil mensais.
Causas da aposentadoria compulsória
As infrações que levam à aposentadoria compulsória variam, incluindo práticas como nepotismo, venda de sentenças, abuso de autoridade, improbidade administrativa e assédio sexual. No ano de 2024, dois juízes, Carlos Madeira Abad e Ather Aguiar, foram aposentados após investigações por denúncias de assédio contra funcionárias. Além deles, destaca-se o caso da juíza Ludmila Lins Grilo, que foi afastada após críticas públicas ao Supremo Tribunal Federal (STF), direcionadas a ministros como Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso.
Em 2025, outros dois casos também chamaram a atenção: o juiz Ronaldo João Roth foi afastado por violar o direito constitucional ao silêncio de réus durante interrogatório, e Carlos de Souza foi aposentado após ser flagrado furtando uma peça sacra durante uma viagem.
Discussões em torno da manutenção dos proventos
A manutenção dos proventos após a aposentadoria compulsória é um tema que suscita debates entre juristas. Algumas vozes críticas defendem que essa prática representa uma forma velada de impunidade, especialmente em um país que enfrenta grandes desafios socioeconômicos, como aponta Fernando Bentes, professor de Direito Constitucional da UFRRJ: “É quase imoral que recursos públicos sustentem pessoas afastadas por má conduta.”
No entanto, outros especialistas, como Thiago Varela da PUC-RJ, argumentam que a perda do cargo só ocorre por sentença judicial, afirmando que essa proteção é essencial para garantir a independência do Judiciário frente a eventuais pressões políticas.
Novas medidas após as penalidades
Recentemente, o Conselho Federal da OAB anunciou a abertura de um procedimento administrativo para cassar o registro de advogado de Marcelo Bretas, após sua punição com a aposentadoria compulsória. Essa decisão representa um passo importante na responsabilização de magistrados que cometeram infrações e evidencia a pressão crescente sobre o sistema judicial brasileiro para manter altos padrões éticos.
A complexidade e as implicações financeiras da aposentadoria compulsória de juízes no Brasil revelam abertamente a necessidade de reformas no sistema, para evitar que indivíduos afastados por conduta inadequada continuem recebendo uma remuneração significativa dos cofres públicos, ao mesmo tempo que se discute a proteção necessária aos direitos dos magistrados e à independência do Judiciário.