O uso de ferramentas de inteligência artificial (IA) para criar conteúdos ultrarrealistas vem chamando a atenção de especialistas e órgãos fiscalizadores, especialmente à medida que as eleições de 2026 se aproximam. Videos manipulados, como aqueles que circularam sobre o presidente Lula e seu governo, têm o potencial de alterar significativamente o resultado eleitoral, gerando preocupações sobre a desinformação e a manipulação da opinião pública.
O crescimento das deepfakes no contexto eleitoral
Desde as últimas eleições, a Justiça Eleitoral registrou um aumento exponencial no número de ações relacionadas a deepfakes, saltando de apenas três processos em 2022 para 109 em 2024. Até agora, em 2025, já são 51 processos, e a expectativa é que esse número aumente ainda mais até o próximo ano. Segundo Pollyana Ferreira, professora da USP e pesquisadora sobre IA generativa, a evolução dessas ferramentas de geração de conteúdo torna o combate à desinformação um desafio complexo.
A tecnologia evoluiu a tal ponto que qualquer pessoa com acesso às ferramentas pode criar conteúdos falsos. “Hoje, a produção de um vídeo ou imagem manipulada é muito mais acessível e não requer mais um nível de investimento alto ou habilidades técnicas”, explica Ferreira.
Impactos da manipulação de imagens e sons
Os conteúdos gerados por IA não apenas se tornaram mais acessíveis como também mais sofisticados. A capacidade de manipular vozes e imagens está se tornando uma ferramenta poderosa para disseminar informações falsas. Exemplo disso são vídeos que viralizaram nas redes sociais, como aqueles que mostram trechos da âncora Renata Vasconcellos anunciando notícias falsas. Um dos casos mais recentes envolve deepfakes de Lula criando um benefício do Bolsa Família para “mães de bebês reborn”, oferecendo um exemplo claro de desinformação.
Além disso, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também se viu forçado a desmentir um vídeo manipulado que o mostrava anunciando impostos sobre “cachorrinhos de estimação e grávidas”. Tais conteúdos, que inicialmente geraram pânico e confusão, demonstram a velocidade com que a desinformação pode se espalhar, impactando a confiança dos cidadãos nas autoridades e no processo eleitoral.
A resposta da Justiça e das plataformas digitais
Em resposta às crescentes preocupações, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tomou medidas em 2022, liberando o uso de IA desde que explícito que o conteúdo fora gerado por essa tecnologia. No entanto, as deepfakes são terminantemente proibidas. Desde então, diversas investigações foram iniciadas em estados como São Paulo e Rio Grande do Sul, refletindo a necessidade urgente de supervisionar e regular o uso dessa tecnologia.
O Supremo Tribunal Federal (STF) também decidiu que as plataformas digitais podem ser responsabilizadas por conteúdos ilegais postados em suas redes. Com a recente decisão, as big techs não precisarão esperar por uma ação judicial para remover conteúdos falsos, permitindo uma resposta mais rápida a ameaças à integridade do processo eleitoral.
O papel do Congresso na regulamentação da IA
No Congresso, há esforços em andamento para regular o uso de IA e garantir que abusos não afetem a democracia. O senador Chico Rodrigues propôs um aumento nos crimes contra a honra quando estas tecnologias são utilizadas de forma enganosa. Embora esses projetos estejam travados em comissões, a discussão sobre a regulamentação se torna cada vez mais necessária.
Casos internacionais e reflexões sobre o futuro
As implicações da desinformação gerada por IA não são exclusivas do Brasil. Em outras partes do mundo, como Argentina e Estados Unidos, já ocorreram incidências de manipulação de vídeos durante eleições, levando a uma erosão da confiança pública nos processos eleitorais. A realidade é que a tecnologia avança rapidamente, e a legislação precisa acompanhar esse ritmo para proteger a democracia.
Os especialistas alertam para o dilema que se apresenta até 2026: com a melhor acessibilidade à tecnologia de criação de deepfakes, a desinformação pode se tornar uma arma poderosa nas mãos de grupos desonestos, potencialmente comprometendo não apenas a integridade das eleições, mas também a confiança dos cidadãos nas instituições democráticas.
Por fim, o contexto atual exige uma atenção redobrada das autoridades e da sociedade em geral. A conscientização e a educação digital são fundamentais para que os cidadãos possam distinguir entre o que é verdadeiro e o que é fabricado, preservando assim a saúde da democracia brasileira.