Recentemente, um vídeo viralizou ao mostrar uma típica cidade americana, com ruas tranquilas, bandeiras e clima patriota, contrastando com a visão negativa que muitos conservadores têm de grandes cidades como Los Angeles. No entanto, essa narrativa simplista ignora que a cidade retratada é, na verdade, Rockford, Michigan, um suburbano privilegiado com votação majoritariamente democrata.
A ilusão do “small town” e o contexto político real
O vídeo em questão apresenta uma paisagem idílica, com pessoas felizes, motoristas e elementos patrióticos, tentando criar a ideia de um Brasil ou Estados Unidos “verdadeiro”, onde tranquilidade prevalece. Na verdade, a cidade mostrada é Rockford, um subúrbio de Grand Rapids, que votou majoritariamente em candidatos democratas nas últimas eleições. Essa discrepância evidencia que a visão de “cidade pacífica e patriótica” costuma estar associada a áreas brancas, abastadas e com forte preferência política progressista.
Essa associação superficial, apontam especialistas, serve aos interesses de figuras como Charlie Kirk, que usou o vídeo para criticar “uma América em decadência”, ao mesmo tempo em que mantém uma narrativa enviesada, que ignora os problemas enfrentados por cidades grandes e diversificadas como Los Angeles.
Los Angeles sob o olhar de quem vive na cidade
Ao contrário do que propagam certos discursos conservadores, Los Angeles nunca foi uma cidade “em declínio”. Aliás, ela sempre foi uma metrópole de forte imigração, com uma comunidade vibrante e diversa, marcada por desafios, mas também por avanços. Atualmente, o problema não é immigration ou criminalidade, mas ações do governo federal, como ações de ICE que invadem residências e locais de trabalho, agravando o clima de medo na população imigrante.
Segundo reportagens, protestos pacíficos ocorrem na cidade, mas a presença de tropas enviadas por Trump — com 4.000 guardas nacionais e 700 Marines — transformou o cenário, dificultando a mobilidade de moradores comuns, como relatou um trabalhador de downtown que demorou 30 minutos para sair de casa, em vez de 12 minutos habituais. Essas ações reforçam uma narrativa de caos que não condiz com a realidade da maior parte da população que busca apenas viver suas rotinas.
O uso de imagens de uma cidade liberal e branca
O tiro no pé dos defensores de uma narrativa idealizada ficou evidente quando Charlie Kirk divulgou um vídeo de Rockford, Michigan, como símbolo da “América verdadeira”. Ao fazer isso, eles reforçam um estereótipo de pequenas cidades sendo “oásis” de patriotismo e pureza racial, ao mesmo tempo em que ignoram que a maioria dessas regiões vota em candidatos democratas e tem predominância branca, com 72% da população branca, de acordo com dados do US News.
Críticos apontam que essa estratégia busca reforçar o racismo estrutural, ao promover a ideia de que o “verdadeiro” America é aquele sem diversidade racial, elitista e com valores tradicionais, marginalizando as cidades maiores, mais urbanizadas e diversas.
Reações e reflexões sobre narrativa e realidade
Nos comentários e debates nas redes sociais, internautas criticaram o retrato idealizado, afirmando que “pessoas que vivem em pequenas cidades têm medo das cidades”, e vice-versa. A polarização, reforçam, alimenta estereótipos prejudiciais e impede o reconhecimento da complexidade social do país.
Enquanto isso, os moradores de Los Angeles continuam enfrentando seus problemas reais, como a presença de ações federais e o impacto na rotina diária, que difere bastante do cenário de tranquilidade retratado no vídeo viral. A lição aqui é que a simplificação de uma cidade ou comunidade, por mais encantadora que pareça, não reflete a totalidade das experiências e dinâmicas sociais existentes.
Por isso, é fundamental questionar as narrativas que tentam pintar um quadro de “americanidade” pura e simples, compreendendo que o Brasil — assim como os EUA — é uma mosaico de realidades urbanas, rurais, racializadas e políticas, que vão muito além de estereótipos e imagens prontas.