A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, que a Lei 8.989/1995 não exige o registro de restrições na Carteira Nacional de Habilitação (CNH) para que uma pessoa com deficiência possa ter direito à isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na compra de veículo novo. A interpretação da norma, segundo o colegiado, deve priorizar seu objetivo social de promover a inclusão desse grupo.
Direito à isenção de IPI não depende de restrição na CNH
O julgamento teve como foco o caso de um homem com visão monocular que ingressou com mandado de segurança buscando o benefício fiscal. Ele alegou que a exigência de que sua CNH apresentasse restrições específicas não encontra respaldo na legislação. Além disso, questionou o entendimento da Receita Federal de que pessoas com visão monocular não têm direito à isenção, mesmo a condição sendo reconhecida como deficiência pela Lei 14.126/2021.
Após a sentença de primeira instância e confirmação pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), o homem recorreu ao STJ argumentando que a interpretação do tribunal regional ampliou indevidamente os requisitos legais e violou o princípio da legalidade estrita na concessão de incentivos tributários.
Princípio da legalidade e limites da interpretação da lei
O relator do recurso, ministro Afrânio Vilela, reforçou que a Lei 8.989/1995 garante isenção do IPI para pessoas com deficiência física, visual, auditiva ou mental, bem como com transtorno do espectro autista, sem exigir que a CNH contenha restrições ou que o veículo seja adaptado. Segundo ele, a norma é clara ao estabelecer quem tem direito ao benefício, limitando-se ao requisito de comprovação da deficiência.
O ministro destacou que o princípio da legalidade impede que a administração tributária imponha exigências não previstas na legislação. Dessa forma, a análise do direito à isenção deve limitar-se aos critérios estabelecidos na própria lei, sendo ilegal qualquer interpretação que condicione o benefício à ausência de restrições na CNH ou à necessidade de adaptação do veículo.
Na decisão, Afrânio Vilela afirmou ainda que o TRF4, ao negar a isenção por o contribuinte possuir CNH sem restrições, interpretou o documento como indicativo de que ele não tinha deficiência severa ou profunda. Para o relator, tal entendimento cria uma exigência não prevista na lei e desvirtua o seu objetivo principal, que é garantir o benefício para quem realmente possui deficiência.
Revogação de critérios de acuidade visual e campo visual
O ministro também abordou a base de negativa do TRF4, que interpretou a princípio da especialidade ao afirmar que a Lei 14.126/2021, ao reconhecer a visão monocular como deficiência “para todos os efeitos legais”, não teria alterado os critérios de concessão de isenção previstos na Lei 8.989/1995. No entanto, Afrânio Vilela destacou que a revogação explícita do parágrafo 2º do artigo 1º da lei anterior, pela Lei 14.287/2021, eliminou as exigências de acuidade visual mínima ou campo reduzido, não havendo mais fundamento legal para condicioná-la a esses critérios.
Para o relator, “com a comprovação da visão monocular do recorrente, está devidamente demonstrada a condição de pessoa com deficiência visual, necessária para a concessão do benefício”, ao dar provimento ao recurso e garantir o direito do autor.
Leia o acórdão completo do REsp 2.185.814.
Fonte: STJ