O cruzamento entre a geografia do voto da última eleição presidencial e os dados de religião do Censo de 2022, divulgados pelo IBGE, coloca em evidência a dificuldade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em conquistar a confiança dos evangélicos. Este segmento da sociedade brasileira, que representa 26,9% da população, cresce em comparação aos católicos, que estão em declínio. O resultado é claro: os adeptos da religião evangélica desaprovam seu governo em uma proporção muito mais significativa do que outros grupos, como demonstram as pesquisas.
O panorama do voto evangélico
Na última eleição, entre os 14 locais com maior concentração de evangélicos, Lula conseguiu derrotar Jair Bolsonaro (PL) em apenas três, o que destaca a resistência que enfrenta nesse segmento. Nos 13 estados onde a presença evangélica é menor do que a média nacional, o presidente perdeu em apenas três, evidenciando uma polarização religiosa significativa.
Regiões como Amazonas, Pará e Tocantins, onde a maioria da população se declara evangélica (36,8%), mostram um comportamento eleitoral que é desfavorável a Lula. O estado do Pará, onde o presidente obteve uma margem confortável, foi uma exceção, enquanto em Amazonas e Tocantins, a diferença foi de menos de três pontos percentuais.
Desaprovação entre fiéis e católicos
Uma pesquisa recente da Genial/Quaest aponta que 66% dos evangélicos desaprovam a gestão de Lula, um número alarmante que supera os 57% da desaprovação geral e os 53% entre católicos. Este cenário se reflete especialmente nas escolhas eleitorais, onde 69% dos votos válidos dos evangélicos foram para Bolsonaro no segundo turno de 2022.
Felipe Nunes, CEO da Quaest, afirma que a política contemporânea vai além da mera reprodução de questões econômicas, com valores e atitudes assumindo um papel central nas decisões eleitorais. Para ele, o público evangélico mais conservador é influenciado por seus valores, o que, por sua vez, torna desafiador para um governo de esquerda, como o de Lula, conquistar esse eleitorado.
Crescimento e transição social dos evangélicos
O Censo 2022 indica um crescimento contínuo dos evangélicos, uma transição social que Nunes descreve como a mais importante mudança na última década no Brasil. Essa mudança tem um impacto significante nas eleições, levando à virada à direita no país. Segundo ele, os líderes evangélicos têm feito uma mobilização política contra a esquerda, dificultando ainda mais a conexão de Lula com esse eleitorado.
Em Piauí, Lula obteve sua maior vitória em 2022, um estado majoritariamente católico, onde 77% da população é adepta do catolicismo. Com somente 15,5% de evangélicos, essa situação reflete a inversão da tendência observada nos estados com maior população evangélica.
Apesar de sua trajetória histórica favorável entre católicos, a desaprovação de Lula entre esse grupo também aumentou, com 53% dos católicos agora desaprovando sua gestão. Isso sinaliza uma nova dinâmica, mais relacionada à percepção negativa do presidente como um todo do que a uma questão estritamente religiosa, uma vez que o “voto católico” é menos assertivo do que o “voto evangélico”.
Relações históricas e mobilização política
Os pesquisadores apontam que, apesar do vínculo histórico entre o PT e a Igreja Católica — que se voltou contra a desigualdade social através de comunidades eclesiais —, a relação com os evangélicos sempre foi mais fraca, marcada por campanhas contrárias ao partido nas últimas décadas.
Outro dado relevante mencionado é que Lula teve vitórias apenas em 11 das 50 cidades mais evangélicas do Brasil. Embora muitas dessas cidades sejam pequenas e de pouco peso eleitoral, isso demonstra a desconexão entre a comunidade evangélica e o Projeto Político do presidente.
Concluindo, a análise dos dados do Censo de 2022 traz à tona um desafio significativo para Lula: conquistar a confiança de um eleitorado evangélico em crescimento que se mostra, a cada dia, mais distante de suas propostas e ideais políticos.