Um grupo de bispos europeus recorreu ao Papa Leo XIV e à Santa Sé para defender a integridade dos registros de batismo diante de uma recente controvérsia judicial na União Europeia. Em audiência no Vaticano realizada em 23 de maio, o Papa destacou a importância do tema, expressando interesse em ouvir a opinião da Igreja, segundo Alessandro Calcagno, membro da conferência episcopal europeia (COMECE).
Questão jurídica sobre registros de batismo e o GDPR
O caso em análise na Corte de Justiça da União Europeia foi iniciado pelo Tribunal de Apelação de Bruxelas, que busca esclarecer se a recusa da Igreja Católica em apagar nomes de registros de batismo viola o Regulamento Geral de Proteção de Dados (GDPR), vigente desde 2018. A decisão deve sair em 2026 ou 2027.
Segundo Calcagno, tradicionalmente, quando um católico batizado solicita a retirada de seu nome do registro, uma anotação de “formal apostasia da fé” é feita na margem do documento, mantendo-se a matrícula como fato histórico. No entanto, houve casos recentes na Bélgica, especificamente na Diocese de Ghent, onde um indivíduo pediu a exclusão total de seus dados, o que foi contestado pela diocese.
Implicações legais e postura da Igreja
Embora decisões similares tenham ocorrido na Europa desde 1995, todas anteriormente favoreceram a Igreja, que geralmente somente anotava a solicitação de cancelamento. Agora, a tentativa de eliminar completamente os registros ameaça essa jurisprudência consolidada, gerando uma disputa entre autoridades civis e eclesiásticas.
Calcagno alertou para o risco de interpretações seculares do direito canônico, especialmente na Holanda e Bélgica, onde tribunais laicos tentam reinterpretar leis canônicas para favorecer o cancelamento de registros. “Entrar nessa linha de manipulação do direito é um grande perigo”, afirmou.
Esforços do COMECE e posicionamento da Santa Sé
O Conselho de Bispos da União Europeia trabalha em conjunto com a Santa Sé para defender a posição da Igreja nos processos judiciais. Segundo Calcagno, o papel de COMECE inclui consolidar argumentos jurídicos e realizar reuniões com juristas nacionais e internacionais.
Em 17 de abril de 2025, foi publicada uma nota do Dicastério para Textos Legislativos, reforçando que “o direito canônico não permite a modificação ou cancelamento de registros de batismo, salvo correções de erros de transcrição”. A finalidade do registro é garantir a veracidade dos atos religiosos, sustentou o documento.
Perspectivas e o impacto na Igreja
O juiz europeu está atualmente elaborando uma resposta às perguntas do tribunal nacional, num processo que envolve audiências públicas e pareceres de procuradores-gerais. O resultado não deve surgir antes de 2027. Segundo Calcagno, essa deliberação não constitui uma tentativa contra a Igreja, mas uma resposta a solicitações de esclarecimento feitas pelos tribunais nacionais.
No âmbito europeu, há também preocupações acerca do impacto dessas decisões sobre comunidades religiosas e o respeito às informações históricas dos registros de batismo.
Dados recentes e contexto social
De acordo com o relatório anual de 2023, 1.270 católicos na Bélgica solicitaram a eliminação de seus nomes do registro de batismo, muitos motivados por controvérsias envolvendo abusos sexuais. Esse clima de crise e indignação pública influencia diretamente o debate legal.
Hannah Brockhaus, correspondente do Catholic News Agency, destacou que a batalha jurídica é parte de uma discussão maior sobre a autonomia do direito religioso frente às regulamentações europeias, com a Igreja buscando proteger seu patrimônio espiritual e legal.