No dia 23 de maio de 2025, a Pontifícia Universidade Urbaniana em Roma foi palco de um importante encontro que debateu “Temas espinhosos da missão cristã em África: uma releitura dialógica da história para novos percursos de evangelização frutuosa para a África de hoje”. O evento, que contou com a participação do historiador guineense José Lingna Nafafé, teve como um dos focos centrais a análise do livro “Lourenço da Silva Mendonça e o Movimento Negro Atlântico Abolicionista no século XVII”, que explora questões relacionadas à escravatura e reparações.
A contribuição de Lourenço da Silva Mendonça
José Lingna Nafafé, que reside em Londres e é Professor Catedrático Associado de História Africana e do Mundo Atlântico na Universidade de Brixtol, é o autor do livro publicado pela Cambridge University Press em 2022. Este trabalho lhe rendeu o prêmio de “Melhor Livro Acadêmico do Ano”, concedido pela Organização dos Estudos Africanos do Reino Unido. Sua pesquisa se baseia na figura de Lourenço da Silva Mendonça, um príncipe do Reino de Pungo-Andongo, na atual Angola, que no século XVII se opôs à escravatura e suas consequências legais.
Exilado pelos portugueses no Brasil, juntamente com outros membros da família real, Mendonça posteriormente foi enviado para Portugal, onde se tornou Procurador Geral da Confraria dos Homens Pretos. Através de sua formação acadêmica, ele se deparou com a incompatibilidade da escravatura com as leis humanas, naturais e divinas. O historiador destaca que, na época, já havia uma discussão sobre possíveis reparações por abusos cometidos.
Reparações: um tema atual
A questão das reparações pela escravidão tem ganhado cada vez mais atenção, especialmente na diáspora africana e entre as comunidades afrodescendentes. Na entrevista à Rádio Vaticano, Nafafé ressaltou a importância de sua investigação no contexto histórico atual e das lutas contemporâneas por reconhecimento e reparação.
“Os responsáveis pelo Tráfico Transatlântico de Africanos foram compensados financeiramente, então por que não deveríamos considerar a indenização das vítimas?”, questiona o historiador, levantando um ponto crucial em um debate que ainda parece distante do fim. Sua análise aponta para uma necessidade de reconciliar o passado, reconhecendo as injustiças e oferecendo uma resposta adequada às feridas históricas.
A relevância do encontro em Roma
O encontro realizado na Pontifícia Universidade Urbaniana não apenas ofereceu uma plataforma para discutir questões históricas, mas também destacou a necessidade de um diálogo contínuo sobre a evangelização e a justiça social na África contemporânea. Inicialmente promovido pela Associação de Estudantes, Omnes Gentes, em colaboração com o Instituto de Ensino das Artes de Baltimore, o evento reflete uma crescente conscientização sobre a importância dos temas abordados.
Com a participação de acadêmicos e ativistas, o encontro possibilitou a troca de ideias e experiências, unidos pela histórica intersecção entre a religião, a história e os direitos humanos. O desafio de reexaminar a missão cristã na África não é apenas uma busca por compreensão, mas também um chamado à ação em favor da justiça.
Um olhar para o futuro
José Lingna Nafafé expressa a esperança de que sua pesquisa e as discussões em fóruns como o de Roma possam contribuir para um entendimento mais profundo da história e de seus legados. Segundo ele, é essencial que as gerações futuras conheçam e discutam as lutas dos seus antepassados. “A história não deve ser um fardo, mas uma arma de empoderamento”, afirma.
O trabalho de Nafafé aponta para uma verificação necessária das narrativas históricas que moldam o presente e, portanto, destaca a importância do entendimento e do enfrentamento das injustiças passadas. À medida que a sociedade discute a questão das reparações e busca construir um futuro mais equitativo, a análise provocativa sobre Lourenço da Silva Mendonça e seu papel no movimento abolicionista continua a inspirar diálogos importantes.
Em resumo, a figura de Mendonça e aoj seu legado oferecem não só uma lição histórica, mas um modelo de resistência e luta pela justiça que continua a ressoar nos dias atuais.