Enquanto a comissão especial da Câmara dos Deputados inicia discussões sobre um marco legal para a Inteligência Artificial (IA), governadores que se preparam para concorrer à Presidência da República em 2026 avançam com regulações próprias e utilizam a tecnologia a seu favor. Essa movimentação cria um cenário interessante para a política nacional, especialmente à medida que os estados buscam se destacar em um debate que ainda parece indefinido no nível federal.
Os governadores e suas estratégias de inovação
A atividade legislativa em torno da IA está sendo particularmente impulsionada por governadores como Ronaldo Caiado (União) de Goiás, Ratinho Júnior (PSD) do Paraná, e Eduardo Leite (PSD) do Rio Grande do Sul. Esses líderes estão não apenas desenvolvendo leis que fomentem a inovação em IA, mas também aproveitando esses avanços para consolidar uma imagem pública como gestores inovadores. A expectativa é atrair investimentos em tecnologia e contrastar suas políticas com o modelo mais cauteloso do governo federal.
Exemplos de iniciativas estaduais
No início deste mês, a Assembleia Legislativa de Goiás aprovou, por unanimidade, um projeto que estabelece a Política Estadual de Fomento à Inovação em Inteligência Artificial. O projeto, que aguarda sanção, inclui a IA no currículo escolar da rede pública estadual e prevê incentivos para a instalação de data centers, além da criação de um centro estadual de computação destinada ao treinamento de modelos de IA. Com essa iniciativa, Caiado enfatiza sua oposição ao modelo de regulação do governo federal, que prioriza o controle de dados.
Por sua vez, o Paraná já se adiantou e, em abril, Ratinho Júnior sancionou uma lei com diretrizes para o uso da IA na administração pública. Essa legislação objetiva não apenas capacitar servidores públicos, mas também modernizar a infraestrutura do estado com a criação da Secretaria da Inovação e Inteligência Artificial, buscando tornar o Paraná uma referência nacional em tecnologia.
A movimentação dos governadores acontece em um contexto onde ainda há indefinição sobre a regulação federal da IA discutida na Câmara, onde o PL 2338, de 2023, que foi aprovado no Senado, está sob análise. O projeto tem sido criticado por ser visto como restritivo por alguns setores, enquanto outros defendem uma abordagem mais cautelosa e centrada na mitigação de riscos, semelhante ao modelo europeu.
Impacto político das regulações estaduais
Para muitos analistas, como Leonardo Meira Reis, a evolução dessas regulação local representa uma estratégia não apenas para incentivar a inovação, mas também um posicionamento político em um cenário eleitoral que se aproxima. Os governadores aproveitam a ausência de uma política coordenada pelo governo federal para se projetarem como candidatos à Presidência. A falta de diretrizes nacionais cria um espaço para que os estados se alcancem como protagonistas na questão da IA.
Um exemplo claro dessa movimentação é a busca de aproximação com grandes empresas de tecnologia. O governo do Paraná estabeleceu acordos com o Google Cloud para implementar a IA em serviços públicos pouco antes da aprovação da nova legislação. No Rio Grande do Sul, Eduardo Leite também se posiciona ativamente na arena internacional, buscando parcerias com gigantes como IBM e Salesforce durante uma missão aos Estados Unidos.
No caso de São Paulo, a grande aposta é na atração de data centers, que são essenciais para a infraestrutura necessária à IA. O recente investimento de R$ 70 bilhões no estado para a instalação ou expansão de centros de dados destaca a importância de uma estrutura adequada à transformação digital.
Desafios e preocupações com a regulação
Apesar das oportunidades, as regulações estaduais também levantam questionamentos sobre a possibilidade de invasão de competências da União, especialmente na proteção de dados pessoais. O colegiado de especialistas aponta que, embora estados tenham a capacidade de fomentar inovação, precisam respeitar as diretrizes nacionais para que não haja sobreposições legais.
Laura Schertel Mendes, professora do IDP e da UnB, observa que essa movimentação de legislações estaduais pode ser benéfica, desde que não comprometa o alinhamento com os parâmetros da União em relação à proteção de dados.
A corrida pela IA entre os governadores, portanto, não é apenas uma estratégia para atrair investimentos e modernizar serviços; é, fundamentalmente, uma jogada política que promete influenciar as eleições de 2026 e moldar o futuro do Brasil em um ambiente digital cada vez mais competitivo.
A busca por um marco regulatório claro continua e, enquanto isso, a luta pelo protagonismo continua entre os governadores, evidenciando a importância da tecnologia em suas plataformas políticas.