Em 25 de agosto de 1961, Jânio Quadros chocou o país ao renunciar à Presidência, alegando que “forças terríveis” o impediam de governar. Este episódio, ainda ressoante na memória coletiva brasileira, provocou uma onda de reações e incertezas, especialmente na ausência do vice-presidente João Goulart, que estava fora do país. Enquanto isso, o governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola, decidiu agir e distribuiu armas à população, prometendo resistir em nome da legalidade. Este momento marcou o início de uma crise política que, embora tenha terminado sem derramamento de sangue, pavimentou o caminho para o golpe militar de 1964.
O impacto da renúncia de Jânio Quadros
De acordo com a socióloga Maria Victoria Benevides, a renúncia de Jânio quase levou o Brasil a uma guerra civil. O novo documentário “1961”, dirigido por Amir Labaki, é uma produção que revisita a crise através de relatos históricos e análises especializadas. Labaki destaca a surpresa dos militares com a renúncia de Jânio, refletindo o caos e a desinformação que permeavam o ambiente político da época.
O enigma da personalidade de Jânio Quadros
O primeiro capítulo da série traz uma análise da controversa figura de Jânio Quadros. Definido por seu ministro Afonso Arinos como “a UDN de porre”, Jânio foi eleito com a promessa de combater a corrupção, mas se distraiu com medidas bizarras, como a proibição do biquíni e combates de galo. A ex-primeira-dama Maria Thereza Goulart descreve Jânio como “uma figura meio estranha”, enquanto a atriz Fernanda Montenegro o classifica como “um desajustado mental”. Essas percepções sugerem um líder que estava longe de ser compreendido por seus contemporâneos.
A tentativa de autogolpe
Um consenso emerge entre os analistas: a renúncia de Jânio foi uma tentativa desastrosa de autogolpe. O ex-embaixador Rubens Ricupero, na época um jovem diplomata, recorda a preocupação que tomou conta dos governantes e da população. Ele se lembrou de um soneto de Carlos Drummond de Andrade que refletia a desolação sentida: “Perdi o bonde e a esperança”. Este sentimento de incerteza estava presente em muitos momentos da história do Brasil, que se viu novamente frente a um momento crucial.
Mobilização popular e a Campanha da Legalidade
Para Leonel Brizola, a batalha estava apenas começando. Ele, que era cunhado de João Goulart, apostou na mobilização popular para garantir a posse do vice-presidente. O rádio, segundo o jornalista Flávio Tavares, tornou-se a grande arma de Brizola durante a Campanha da Legalidade. A situação se deteriorou a ponto de o ministro da Guerra ter dado ordens para bombardear o Palácio Piratini, fortemente defendido por civis. Contudo, a carnificina foi evitada por sargentos da Força Aérea Brasileira (FAB), que impediram os aviões de decolar.
O acordo inesperado de Jango
Apesar do esforço de Brizola, João Goulart acabou fazendo um acordo com os militares, aceitando tomar posse com poderes limitados em um arremedo de parlamentarismo. Essa decisão não agradou suas bases e foi vista como um compromisso que prenunciavam os eventos que culminariam no golpe militar de 1964. O ex-ministro Ricupero explica que o que se viu em 1961 foi um “trailer”, um ensaio do que aconteceria três anos depois.
As lições da história e o documentário “1961”
Além de entrevistas e imagens de arquivo, “1961” também apresenta informações recém-liberadas da CIA e trechos inéditos do testemunho do general Ernesto Geisel. Este projeto é uma reflexão necessária sobre como as crises políticas podem se repetir ao longo da história. Labaki, que baseou o roteiro em seu livro “1961 — A crise da renúncia e a solução parlamentarista”, enfatiza a importância da punibilidade para aqueles que atacam a democracia. Ele alerta que “os golpistas de 1961 foram anistiados, voltaram a conspirar e derrubaram o governo três anos depois”, oferecendo uma visão crítica que ecoa até os dias de hoje.
A série “1961” tem seu primeiro episódio exibido às quintas-feiras, às 21h30, no Canal Brasil e no Globoplay, e serve como um alerta sobre a importância de proteger a democracia contra tentativas de golpe, revisitando um capítulo crucial da história brasileira.