A Lei Cidade Limpa, que foi criada em 2006 pelo ex-prefeito Gilberto Kassab para combater a poluição visual em São Paulo, enfrenta novos desafios com a aprovação de um projeto que pode alterar significativamente suas diretrizes. Na última quarta-feira, 21 de março, a Câmara Municipal aprovou em primeira votação uma proposta que permite a ocupação de até 70% de bens de valor cultural por propagandas, além de flexibilizar as restrições de tamanho e localização de anúncios publicitários.
Consequências da nova proposta
Idealizada pelo vereador Rubinho Nunes (União), a proposta visa transformar áreas-chave da cidade, como a Avenida Paulista e a Santa Efigênia, em uma espécie de “Times Square brasileira”. O texto foi aprovado em uma votação simbólica, que avançou rapidamente, com a oposição expressando resistência em relação às mudanças. Apenas as bancadas do PT e do PSOL, além de alguns vereadores do PSB e do PP, votaram contra.
A evolução da Lei Cidade Limpa
A Lei Cidade Limpa, estabelecida por Kassab, ganhou notoriedade ao remover cerca de 15 mil outdoors de São Paulo, tornando-se um símbolo de respeito à paisagem urbana. Após sua implementação, a lei ajudou Kassab a ser reeleito em 2008, refletindo o apoio popular massivo, tendo em vista que a proposta visava deixar a cidade mais limpa e esteticamente agradável.
No entanto, mudanças têm ocorrido desde a administração do ex-prefeito João Doria, quando, em 2017, foram regulamentados painéis publicitários de até 20 metros quadrados nas Marginais do Tietê e Pinheiros. Recentemente, novos tipos de publicidades, como telões de LED em vitrines, começaram a ser utilizados em desacordo com as restrições anteriores da lei, gerando polêmica sobre a execução e fiscalização das suas diretrizes.
Impactos da flexibilização da legislação
Com a nova proposta, a preocupação entre especialistas em urbanismo aumentou. O professor Valter Caldana, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, classifica a Lei Cidade Limpa como uma das maiores conquistas urbanísticas do século, mas alerta que a permissividade na aplicação da lei pode levar à degradação do padrão visual da cidade. “As pequenas infrações estão se acumulando, criando um padrão que poderá ser irreversível,” adverte Caldana.
No plenário da Câmara, a oposição expressou surpresa com a rapidez da votação. O vereador Nabil Bonduki (PT), arquiteto e urbanista, criticou a aplicação branda da lei que poderia resultar na perda de conquistas urbanísticas. “É preciso uma atualização da legislação para endurecer as regras,” afirmou.
Consultas públicas e próximo passo da proposta
A vereadora Renata Falzoni (PSB) destacou que a opinião pública é essencial para a avaliação do projeto e sugeriu a realização de audiências públicas para debater as mudanças propostas. Enquanto isso, não há um prazo definido para a segunda votação, que é o último passo antes da possível sanção do prefeito Ricardo Nunes.
Além das mudanças no tamanho e na quantidade de publicidade permitida em prédios, a proposta revoga aspectos fundamentais da Lei Cidade Limpa, tal como a proibição de propagandas em áreas de valor cultural. Empresas que antes eram limitadas em tamanho e quantidade de anúncios agora terão mais liberdade, o que pode resultar em uma paisagem urbana drasticamente alterada.
Considerações finais
A Secretaria Municipal das Subprefeituras (SMSUB) informou que entre 2020 e maio de 2025, 1.333 autuações da Lei Cidade Limpa foram realizadas. Apesar de ser aplicada, a fiscalização ainda é alvo de críticas, especialmente pela percepção de que há uma “vista grossa” a pequenas infrações, que podem, com o tempo, se somar a um grande problema. Com um debate acirrado à frente, a comunidade paulistana deverá se mobilizar para influenciar os rumos do que pode ser a reinvenção de um símbolo da cidade.