Por conta da legislação brasileira que restringe o desenvolvimento de produtos à base de cannabis, Ana Julia Kiss decidiu levar a Humora para os Estados Unidos, mais precisamente para a Califórnia, em 2022. A iniciativa visa explorar um mercado mais avançado e aberto ao uso medicinal e de bem-estar de cannabis, com forte base tecnológica.
Expansão e estratégia da Humora nos EUA
Anteriormente, a Humora terceirizava a produção no laboratório No Bloom Botanicals, focando na comercialização no Brasil através de importações regulamentadas pela Anvisa. Segundo Ana Julia Kiss, em janeiro de 2024 a startup adquiriu integralmente o laboratório, passando a atuar diretamente no mercado americano, ofertando produtos via private label e comercialização direta.
Essa aquisição deve impulsionar o faturamento da Humora, que em 2024 atingiu R$ 1 milhão, podendo triplicar nos próximos anos — explica Kiss. A empresária destaca que os mercados brasileiro e americano se apresentam com realidades distintas: enquanto no Brasil a cannabis medicinal é regulada pela Anvisa e a importação é individual, nos EUA os produtos são de venda livre e possuem forte atuação promocional.
Produtos, mercado e concorrência
Atualmente, a Humora dispõe de nove produtos destinados ao bem-estar em áreas como TPM, sono, performance sexual e imunidade. Nos Estados Unidos, o tíquete médio é de US$ 20 (cerca de R$ 113), enquanto no Brasil esse valor chega a R$ 1.000. Apesar das oportunidades, a concorrência no mercado de cannabis é intensa: no Brasil, há aproximadamente 800 marcas autorizadas, enquanto nos EUA essa cifra passa de 6 mil, disputando um mercado de US$ 30 bilhões (R$ 169 bilhões).
Startups brasileiras no Vale do Silício
A Humora é uma das cerca de 500 startups brasileiras que atuam internacionalmente, sendo que aproximadamente 10% estão nos Estados Unidos, principalmente no Vale do Silício, segundo o estudo “Brazil Tech Diaspora”, da Endeavor. O principal destino dessas empresas na Califórnia responde por 20% delas, seguida pela Flórida e Nova York.
Marcella Falcão, head de Growth do Cubo, alerta que o mercado americano demanda maturidade elevada e apresenta uma concorrência feroz, além de diferenças culturais e regulatórias. Ela destaca que as empresas precisam exercer humildade, contratar profissionais locais e entender claramente o ambiente de negócios para obter sucesso na expansão.
Desafios e oportunidades na internacionalização
Marcelo Castro, CEO da Zalppy, reforça que negócios de setores inovadores, como fintechs, healthtechs e soluções de energia, têm boas chances de crescimento ao nascer pensando globalmente. Para Castro, a participação em eventos e a elaboração de planejamentos sólidos são essenciais, pois o risco e a competitividade nos EUA são altos, especialmente após o período da era Trump, que trouxe restrições de vistos e entrada.
Wana Schulze, da Vivo Ventures, chama atenção que o momento exige cautela. Antes de apostar na internacionalização, as empresas devem verificar se o produto é relevante para o mercado local e se há parceiros dispostos a colaborar, além de estar conscientes dos desafios regulatórios e políticos que podem afetar a entrada.
Contexto econômico e cenário de investimentos
Apesar das dificuldades, o ambiente também apresenta oportunidades. Com o retorno de fundos estrangeiros ao Brasil, mesmo com maior seletividade, há maior disposição para investir em startups com potencial de escalabilidade internacional. Segundo Schulze, investidores estão mais atentos a ativos com valor, embora com menos apetite de risco do que há alguns anos.
Entre exemplos de sucesso no exterior, destaque para a Rankmyapp, que saiu de um faturamento estimado de R$ 12 milhões em 2024, atendendo clientes globais como Nike, Adidas e McDonald’s. Fundada em 2015, passou seis meses no Vale do Silício com aceleradora, o que facilitou sua expansão internacional, conforme explica Leandro Scalise, CEO da empresa.
Os limites da internacionalização e os obstáculos
A situação atual demanda preparação e cautela: Graziela Vital, professora de Relações Internacionais, recomenda que as startups avaliem se há real demanda local e se o momento é adequado para entrada. Ela destaca que as mudanças políticas e jurídicas podem afetar os negócios, especialmente após o impacto de políticas protecionistas e restrições de visto.
Sobretaxas e tarifas também desafiam o comércio exterior, embora fabricantes brasileiros mantenham estabilidade nas exportações de máquinas, de acordo com estudos recentes. Nesse cenário, a conexão com o Vale do Silício permanece uma estratégia valiosa, consolidando o Brasil como fonte de inovação e talento global.
Para saber mais detalhes, acesse o conteúdo completo no Globo.
tags: startups, internacionalização, cannabis, inovação, mercado dos EUA