Brasil, 21 de maio de 2025
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O legado de Leão XIII e a luta contra a escravatura em África

Nova pesquisa destaca o papel de Leão XIII e sua coleção de subsídios na luta contra a escravatura na África.

O nome Leão XIV, adotado pelo novo Papa, suscita muito interesse pelo seu antecessor Leão XIII, cuja encíclica Rerum Novarum é amplamente citada por ter lançado as bases da Doutrina Social da Igreja. Contudo, este Pontífice também tem outras duas encíclicas que merecem atenção especial por sua contribuição à luta contra a escravatura em África. São elas In Plurimis e Catholicae Ecclesiae, conforme observa a historiadora belga Élisabeth Bruyère.

O papel crucial do Cardeal Lavigerie

In Plurimis (1888) e Catholicae Ecclesiae (1890) foram as duas encíclicas de Leão XIII que impulsionaram a luta contra a escravatura. A primeira, focada na luta abolicionista, era direcionada especialmente aos bispos do Brasil, enfatizando que a escravatura contradiz a doutrina cristã. A segunda, com um “maior alcance jurídico”, estabelecia uma coleta obrigatória para os escravos africanos, explica Bruyère, doutorada em direito e investigadora em história contemporânea na Universidade de Lovaina, na Bélgica.

A atuação do Cardeal Charles Martial Lavigerie foi fundamental para isso. Ele testemunhou os mercados de escravos do Norte da África, o que motivou Leão XIII a se envolver na luta anti-escravagista. O prelado francês fundou em 1868 a Sociedade dos Missionários de África (Padres Brancos) e, no ano seguinte, a Congregação das Irmãs Missionárias de Nossa Senhora de África (Irmãs Brancas). Os missionários atuaram no centro da África e também foram expositores dos horrores da escravidão, como “incursões e caçadas humanas”. Esse contato chocou profundamente o Papa, refletido em seus documentos, conforme observa Bruyère.

A “Colecta da Epifania”

Para combater a escravatura, impulsionado pelo Cardeal Lavigerie e pela encíclica Catholicae Ecclesiae, Leão XIII instituiu em 1890 uma coleta obrigatória, no Domingo da Epifania, em toda a Europa. Conhecida como “subsídio anti-esclavagista” ou “Colecta da Epifania”, tinha como objetivo direcionar recursos financeiros para a Congregação para a Propagação da Fé – hoje chamada Dicastério para a Evangelização.

Esses fundos eram distribuídos para diferentes missões na África Subsaariana, com uma exceção para os países de língua portuguesa, que não pertenciam ao âmbito da Propaganda Fide. Bruyère estima que entre 1920 e 1939, cerca de 50 milhões de liras foram arrecadadas, totalizando 70 milhões de euros em valores atuais.

“Redimir os escravos” para “salvar as almas”

Inicialmente, os recursos serviam para comprar escravos nos mercados. Os missionários adquiriram crianças, que custavam menos, com o objetivo de “salvar mais almas”. Com a ocupação colonial e a imperialista europeia na África, o comércio de escravos começou a desaparecer, mas mercados clandestinos ainda existiam. Enquanto o tráfico público foi abolido, novas formas de exploração, como o trabalho forçado, surgiram.

Enfrentar a servilidade doméstica

Conforme os mercados de escravos diminuíam, os missionários mudaram seu foco para a servidão doméstica, que também era uma forma de escravidão. Eles resgataram muitas pessoas e fundaram orfanatos, criando lares cristãos e vilas em vez de estabelecer centros de culto. No entanto, essas vilas enfrentaram resistência das autoridades coloniais, que viam os missionários como concorrência.

De escravos a evangelistas

Com o declínio das práticas escravagistas, os recursos que antes eram usados na compra de escravos foram canalizados para financiar as missões. Esses fundos ajudaram a pagar os catequistas, abrir dispensários e escolas, além de estabelecer congregações locais. As pessoas libertadas da escravatura, especialmente as crianças, tornaram-se o “primeiro viveiro dos convertidos à fé católica” e desempenharam papéis cruciais como catequistas, embora muitas vezes fossem subestimados.

Mais investigação e estudos aprofundados

Élisabeth Bruyère acredita que ainda há um vasto espaço para investigação sobre a ação anti-esclavagista da Propaganda Fide e a utilização dos subsídios enviados para missões africanas até o final da década de 1950. Os missionários enviavam detalhados relatórios à Congregação sobre o uso dos recursos. A historiadora salienta a necessidade de aprofundar nestas histórias, mencionando suas pesquisas promovendo reflexões sobre o papel dos missionários como redentores, e como eram percebidos nas comunidades locais.

O legado de Leão XIII e a sua luta contra a escravatura revelam um aspecto complexo e significativo da história religiosa e social na África, com impactos que ressoam até os dias atuais.

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