A recente decisão do governo federal de restringir o acesso a parte das informações relacionadas a convênios públicos gerou polêmica e críticas de diversas entidades e especialistas. Estima-se que a medida afete cerca de 16 milhões de documentos, de acordo com o Ministério da Gestão e Inovação (MGI). Esses arquivos, que antes estavam disponíveis na plataforma TransfereGov, incluem dados cruciais como planos de trabalho, notas fiscais, termos de parceria e relatórios de prestação de contas dos gastos públicos.
Implicações da restrição no acesso a documentos
Os documentos que agora estão restritos incluem conteúdos essenciais sobre convênios firmados com Organizações Não-Governamentais (ONGs) e empresas contratadas para a execução de obras. Essa medida, que abarca acordos totalizando mais de R$ 600 bilhões em recursos da União, representou um retrocesso significativo na transparência administrativa. A decisão também impacta informações relativas a emendas parlamentares, incluindo aquelas alocadas no controverso “orçamento secreto”, declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2022.
Conforme comunicado oficial do MGI, a justificativa para a restrição se baseia no fato de que “mais de 16 milhões de documentos anexados desde 2007 podem conter dados sensíveis”, e que o acesso a essas informações será permitido apenas por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI). O ministério esclareceu que, enquanto mantêm a proteção das informações sensíveis, os dados principais dos convênios, como os valores e CNPJ dos fornecedores, continuarão disponíveis na plataforma TransfereGov.
Defesa da transparência e crítica à medida
Adauto Modesto, secretário-executivo adjunto do MGI, afirmou que os documentos em questão precisam passar por um processo de tratamento para que as informações pessoais contidas não sejam indevidamente divulgadas. No entanto, essa justificativa foi contestada por especialistas em transparência. Segundo Marina Atoji, gerente de Programas da Transparência Brasil, a limitação no acesso à íntegra dos documentos prejudica a fiscalização e controle social sobre os gastos públicos. “É inaceitável que termos de convênio com municípios estejam fora do alcance do público”, destacou Atoji, reforçando que a falta de transparência representa uma lacuna grave na supervisão das transferências de recursos.
A situação se torna ainda mais complicada uma vez que a própria Advocacia-Geral da União (AGU) contradisse a interpretação do MGI, afirmando que o parecer que fundamentou a decisão do ministério não impede o acesso aos documentos. Em declaração à imprensa, a AGU enfatizou que “os documentos continuam plenamente acessíveis, auditáveis e publicamente disponíveis”. Isso gera um desconforto entre a sociedade civil, que vê na restrição uma tentativa de ocultação das ações governamentais.
Visão do governo sobre a questão
A Secretaria de Comunicação Social da Presidência se manifestou, assegurando que “as informações relevantes das transferências e parcerias continuam disponíveis”. As autoridades ressaltam, que há um compromisso do governo com a transparência na gestão de recursos públicos e a conformidade com a legislação em vigor. Apesar desse compromisso explícito, a situação atual levanta preocupações sobre o real nível de transparência que o governo está disposto a oferecer aos cidadãos.
Em evento recente, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva destacou a importância da transparência para a democracia, afirmando que “sem transparência, não há democracia”. Ele criticou a prática anterior de sigilo adotada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e prometeu seguir com uma gestão que valorize o acesso à informação como um direito fundamental previsto na Constituição.
Contudo, a crítica à nova decisão do governo evidencia um dilema sobre como equilibrar transparência e proteção de dados pessoais. Com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) em vigor, o desafio de garantir a segurança das informações sem sacrificar a essência da transparência continua a ser um tema em debate. Especialistas, cidadãos e entidades civis aguardam um desdobramento que permita um maior acesso às informações, essencial para um controle social efetivo e democrático.
A comunidade deve permanecer atenta e pressionar por um retorno aos padrões de transparência que garantam o acesso a informações públicas essenciais, sem comprometer o direito à privacidade. Somente assim a confiança nas instituições pode ser restaurada.