Volnei Tavares, um médico que se tornou um defensor da causa contra a violência sexual, compartilha sua impactante jornada de superação após ser vítima de abuso na infância. O seu testemunho largo e profundo traz à luz o tema da violência sexual, que continua a ser um tabu na sociedade brasileira e, frequentemente, causa grandes traumas que se arrastam durante toda a vida.
A infância marcada pela violência
Volnei relembra que suas primeiras experiências de trauma ocorreram quando ele tinha apenas cinco anos. Entretanto, foi somente aos 21 anos que começou a compreender a profundidade do que havia vivenciado. Ele declarou: “Eu levei talvez mais 10 anos para conseguir ressignificar, trabalhar com todas as amarras que deixaram na minha vida. Foi muito tempo.” Esta reflexão revela o longo processo que muitas vítimas enfrentam ao tentar entender e lidar com suas experiências traumáticas.
Números alarmantes da violência sexual no Brasil
Os dados sobre violência sexual contra homens e mulheres no Brasil são alarmantes. Entre 2020 e 2024, 45.716 homens foram vítimas de estupro. Este mês de janeiro, o país registrou o maior número de casos de violência sexual dos últimos seis anos, com 1.117 ocorrências. Embora os homens sejam parte significativa das estatísticas, as mulheres continuam a ser a maioria, com 339.598 vítimas nesse mesmo período. Das vítimas, 88,1% eram mulheres, enquanto 11,8% eram homens.
O medo como obstáculo às denúncias
O médico Tavares acredita que o medo é um dos principais fatores que dificultam que muitas vítimas denunciem seus abusadores. “Geralmente, os abusadores eram pessoas da família. Então, eles te ameaçam e isso envolve também a vergonha que sentimos. Me chamavam de veadinho e eu sequer sabia o que isso significava. Viver no mesmo ambiente que os agressores, somado à imaturidade psicológica, faz com que leve muito tempo para as vítimas conseguirem se dar conta do que aconteceu.” Essas palavras ecoam a realidade de muitos que enfrentam este tipo de violência, mostrando como a dinâmica familiar pode intensificar o sofrimento.
Ressignificação e o poder da literatura
Volnei encontrou um caminho para ressignificar sua história através da escrita. Ele lançou o livro “O primeiro estupro – a morte de minha alma”, sob o pseudônimo Joaquim Manoel. O objetivo da obra é sensibilizar o leitor e levantar questões sobre a violência sexual, buscando empatia e compreensão. Em suas páginas, ele retrata não apenas sua trajetória, mas também as violências e negligências que sofreu ao longo de sua infância e adolescência.
O impacto da ajuda mútua
Com suas experiências e dedicando-se a trabalhos voluntários, Tavares consegue ajudar outras pessoas a lidarem com suas próprias histórias de trauma. “Eu encontro as pessoas que um dia eu já tive a oportunidade de cuidar e vejo que muitas conseguiram sair daquela situação de abandono familiar e de violência sexual. Quando me veem como referência, isso dá significado ao que aconteceu comigo. Eu não devo ter vergonha por ter sido vítima, eles que deveriam ter vergonha por fazerem o mal,” afirma, demonstrando que a superação é possível e que a solidariedade é um caminho de cura.
Um chamado à ação
O testemunhos e a trajetória de Volnei Tavares são um poderoso lembrete de que a luta contra a violência sexual deve incluir a voz de todos os sobreviventes, independentemente de gênero. A conscientização é fundamental, e o apoio às vítimas é crucial para que mais pessoas tenham a coragem de falar e buscar ajuda.
Assim, ao trazer esses relatos à tona, a sociedade avança em direção a um entendimento mais abrangente sobre a violência sexual e a necessidade de um espaço seguro onde as vítimas possam compartilhar suas experiências sem medo ou vergonha. A mensagem é clara: é possível ressignificar a dor e transformar o trauma em força e proteção para outros que talvez ainda estejam lutando em silêncio.
Volnei Tavares não apenas sobreviveu a sua experiência, mas também se tornou um farol de esperança para muitos, mostrando que é possível buscar apoio e, mais importante, encontrar a paz após a tempestade.