A 2ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) proibiu instituições financeiras de bloquearem o celular usado como garantia de empréstimos de seus clientes. O julgamento, que aconteceu na última quinta-feira (dia 8), foi unânime e a decisão entrou em vigor imediatamente em todo o país. Essa resolução surge em um contexto onde o uso de dispositivos móveis como garantia tem se tornado uma prática comum, especialmente entre financeiras que atendem ao público de baixa renda.
Proibição de práticas coercitivas
As financeiras Supersim e Socinal, voltadas para públicos de baixa renda, foram alvo da ação civil pública movida pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), através da 1ª Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor (Prodecon), em parceria com o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). A decisão proíbe essas empresas de exigirem a instalação de um aplicativo no celular de seus clientes, cujo objetivo era realizar o bloqueio remoto dos aparelhos em caso de inadimplência.
Além disso, as instituições devem remover, em até 15 dias, os aplicativos das lojas virtuais, como Google Play Store (Android) e App Store (iOS). O não cumprimento desta determinação está sujeito a uma multa diária de R$ 100 mil. A decisão foi bem recebida por organizações de defesa do consumidor, que veem a prática como uma violação dos direitos fundamentais dos usuários.
Impactos na vida dos consumidores
No site da Supersim, por exemplo, um anúncio de empréstimo com celular como garantia ainda estava disponível na manhã do último sábado (dia 10). No entanto, ao clicar no botão da oferta, aparece uma tela de erro. Por outro lado, no site da Socinal, não há menção ao serviço. Novos contratos firmados com a exigência do dispositivo também serão punidos, resultando em multas de R$ 10 mil por cada empréstimo feito a partir da decisão.
Em nota, o Idec considera o bloqueio de celular como uma “chantagem digital” contra pessoas de baixa renda, vulneráveis e endividadas. O instituto declarou: “Ao transformar um bem essencial — o celular — em instrumento de coerção, a SuperSim extrapolou todos os limites do razoável e expôs o que há de mais perverso no mercado de crédito: lucrar com o desespero de quem já não tem quase nada.”
Reestabelecendo o equilíbrio nas relações de consumo
Para o promotor de Justiça Paulo Binicheski, a proibição dessa prática reestabelece o equilíbrio nas relações de consumo e garante acessos essenciais que são viabilizados por meio do celular. Ele afirma: “O celular é um bem de uso essencial. Sua privação, imposta por bloqueio remoto, compromete o acesso do consumidor a serviços bancários, saúde, educação e programas sociais, como o Bolsa Família.”
A decisão também frisa que o bloqueio unilateral do celular, realizado sem autorização judicial ou notificação prévia, viola o devido processo legal garantido pela Constituição Federal. Para o Prodecon, essa prática é uma medida coercitiva desproporcional e incompatível com os princípios do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Taxas de juros abusivas
Além das práticas coercitivas, o Tribunal reconheceu o abuso nas taxas de juros praticadas pelas financeiras, que chegavam a 18,5% ao mês, muito acima da média divulgada pelo Banco Central no mesmo período. Até a publicação desta reportagem, o Banco Central não havia comentado sobre as acusações de cobranças excessivas.
A decisão do TJDFT é um importante passo na proteção dos direitos dos consumidores, especialmente aqueles mais vulneráveis, que frequentemente enfrentam condições desiguais em relações de crédito. O movimento demonstra uma preocupação com a ética nas práticas financeiras e um compromisso em garantir que os direitos dos consumidores sejam respeitados.
As instituições financeiras terão agora que se adaptar a essa nova realidade, evitando práticas que possam ser interpretadas como coercitivas e assegurando que os serviços oferecidos estejam em conformidade com as legislações vigentes.
Procuradas para comentar a determinação da Justiça, as financeiras não responderam até a publicação desta reportagem.