Brasil, 9 de maio de 2025
BroadCast DO POVO. Serviço de notícias para veículos de comunicação com disponibilzação de conteúdo.
Publicidade
Publicidade

Câmara dos Deputados tenta suspender processo sobre tentativa de golpe

Especialistas criticam manobra que pode proteger acusados de crimes contra a democracia.

A polêmica envolvendo a tentativa de golpe de Estado no Brasil ganha novos contornos após a decisão da Câmara dos Deputados, que aprovou a suspensão do processo penal que envolve o ex-presidente Jair Bolsonaro e 33 outros acusados. Especialistas em direito constitucional analisam a manobra em curso e destacam possíveis violações legais.

A manobra na Câmara dos Deputados

Na última quarta-feira (7), a Câmara dos Deputados aprovou, com 315 votos a favor e 143 contra, a suspensão das ações relacionadas à tentativa de golpe com base no artigo 53 da Constituição. Este artigo permite a interrupção de processos criminais contra parlamentares durante o mandato. A medida foi justificada pela participação do deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ) na denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR).

Contudo, a decisão gerou reações adversas entre partidos de centro-esquerda, que já prometem recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF). A expectativa é que o STF se posicione sobre a matéria, podendo anular ou modificar a decisão da Câmara.

A interpretação constitucional em debate

De acordo com os juristas consultados, a manobra da Câmara não pode se estender à imunidade parlamentar de outros réus, que não foram eleitos, mas estão envolvidos no mesmo processo. O professor Gladstone Leonel Jr., da Universidade de Brasília (UnB), classificou a arguição feita pela Câmara como um “malabarismo interpretativo” que contraria o disposto na Constituição.

“O artigo 53 é claro ao se referir à denúncia contra senador ou deputado. Não pode ser extensivo a outros acusados que participam da mesma ação”, afirmou Gladstone, enfatizando que a norma se aplica exclusivamente a parlamentares.

O professor Georges Abboud, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, citou a Súmula 245 do STF, destacando que a imunidade parlamentar não deve ser aplicada a corréus em ações penais.

“Isso já foi esclarecido pelo Supremo. Sustar a ação penal está intimamente ligado à imunidade parlamentar. Não se pode estender isso de forma indiscriminada, pois isso interfere no funcionamento de outro Poder”, disse Abboud.

O papel do relator e as divergências na Câmara

O relator da proposta, deputado Alfredo Gaspar (União-AL), defendeu que a Câmara se limitou a seguir o que está na Constituição, que permite sustar o andamento de ações penais enquanto nenhum veredito final é proferido.

Porém, as alegações de Gaspar foram contestadas. A Constituição determina que apenas crimes cometidos após a diplomação de deputados podem ter suas ações suspensas. A diplomação do deputado Ramagem ocorreu em 16 de dezembro de 2022, enquanto as acusações relacionadas à organização criminosa e tentativa de golpe datam de antes desse período.

“O crime de organização criminosa se consuma no momento em que se estabelece um accordo para o golpe, ou seja, isso aconteceu antes da diplomação”, apontou Gladstone.

A definição de golpe de Estado

Há uma intensa discussão sobre a caracterização do crime de tentativa de golpe. O STF reiterou que a Câmara não poderia suspender o processo penal sobre esse delito. Gaspar, no entanto, argumentou que um golpe somente poderia ser tentado após a posse do novo governo legitimamente constituído.

“A tentativa de golpe contra um governo legitimamente constituído somente poderia ocorrer após a instalação do novo governo”, defendeu o relator em seu parecer.

Por outro lado, Abboud argumenta que um governo legitimamente constituído deve ser entendido como o resultado das eleições, que garantiram a presidência a Luiz Inácio Lula da Silva em 30 de outubro de 2022.

“A proteção deve recair sobre as eleições livres e democráticas. Desde o momento em que as urnas foram abertas, a legitimidade estava em jogo”, avaliou.

A denúncia e suas implicações

A denúncia que motivou toda essa controvérsia, apresentada pela PGR, alega que o objetivo da trama era anular as eleições presidenciais de 2022 e inclui ameaças de assassinato contra diversos líderes políticos, incluindo o presidente Lula e o vice-presidente Geraldo Alckmin.

Os acusados negam as alegações e defendem uma interpretação que diminui a gravidade das ações que caracterizam a tentativa de golpe de Estado.

É evidente que a decisão da Câmara e a defesa apresentada pelos envolvidos suscitam debates profundos sobre a imunidade parlamentar, a interpretação da Constituição e a proteção do sistema democrático. O que se desenha é uma luta judicial que poderá estabelecer precedentes significativos para o funcionamento da política brasileira nos próximos anos.

PUBLICIDADE

Institucional

Anunciantes