Brasil, 19 de março de 2025
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Fiscalização ou Espetáculo? O peso das prioridades na Segurança Pública do Piauí

Enquanto dados da violência crescem, entes de segurança preferem gastar tempo e dinheiro com jovens imbecis
José Ribas Neto

A operação Rolezinho é importante, claro que é. O barulho ensurdecedor de escapamentos adulterados incomoda, as manobras irresponsáveis colocam vidas em risco e a sensação de impunidade alimenta o caos urbano.

Mas sejamos honestos, o problema central do Piauí – e do Brasil – não é só o motoqueiro que empina sua moto. O verdadeiro crime está em outro lugar, muito mais perigoso e corrosivo para a sociedade. Está na corrupção sistêmica e no narco-estado que nosso país virou.

“Dar grau” é uma infração gravíssima. O artigo 244, inciso III do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), tipifica a prática como passível de multa, suspensão da CNH e retenção do veículo. Não há o que discutir: a lei é clara, e a punição está prevista.

Mas a questão que se impõe é simples e objetiva, se há um esforço midiático e policial para combater essa prática, onde está a mesma intensidade de ação contra o crime organizado que, de fato, mata, destrói e corrompe o tecido social?

Enquanto motos são apreendidas em grandes operações televisionadas, o Piauí vê um crescimento alarmante da violência. O número de feminicídios no estado cresceu 42,9% em 2024 em relação ao ano anterior, com 40 mulheres assassinadas. Outro dado da Rede de Observatórios da Segurança, mostra que o Piauí tem a segunda maior taxa de violência contra a mulher entre os nove estados monitorados, com 7,22 casos por 100 mil habitantes.

Facções criminosas se expandem, espalhando terror nos bairros mais pobres e nas cadeias públicas. Inclusive com direito a tribunal do crime e leis paraestatais nestes bairros, onde se deve baixar o vidro do carro para não ser metralhado.

Há denúncias graves de policiais civis e militares envolvidos no crime organizado, casos que exigiriam uma ação enérgica e corajosa do poder público.

Mas onde está essa mesma força repressiva para enfrentar quem realmente ameaça a sociedade?

É nesse ponto que a operação Rolezinho se torna um espetáculo conveniente.

O combate aos motoqueiros irresponsáveis é necessário, mas transformá-lo na grande pauta da segurança pública é um desvio de foco vergonhoso.

Talvez porque é mais fácil apreender motos do que desmantelar quadrilhas e expor agentes públicos em suas relações com o crime. Talvez porque é menos perigoso reprimir jovens de periferia do que enfrentar facções armadas que tem melhor estrutura de armas que a polícia. Ou talvez porque, em tempos de eleições, os mesmos que hoje vendem esse show midiático tenham passado a campanha defendendo a prática do grau como um “esporte”.

É o teatro da hipocrisia: antes das urnas, um discurso populista e condescendente; depois das urnas, o espetáculo da repressão seletiva.

No fim das contas, a sociedade precisa escolher suas batalhas com inteligência. Manter a ordem no trânsito é importante, mas nada disso terá relevância se o estado continuar fechando os olhos para os crimes que realmente destroem vidas.

Um motoqueiro empinando sua moto pode ser um incômodo, mas ele não aterroriza comunidades inteiras, não infiltra-se nas instituições públicas, não faz reféns sociais. O verdadeiro crime, aquele que deveria ser prioridade, está nas facções, na corrupção, na impunidade.

O que se vê hoje no Piauí não é um combate sério à criminalidade, mas um teatro para desviar o olhar do público.

Se a energia gasta para confiscar motos fosse direcionada ao combate ao crime organizado, talvez os números de violência começassem a cair. Mas esse trabalho não rende cliques, não viraliza em redes sociais, não dá manchetes fáceis. Exige coragem, exige honestidade, exige enfrentar os verdadeiros criminosos – e isso, ao que parece, segue sendo menos interessante do que prender um jovem de cabelo descolorido pilotando uma moto de 160 cilindradas e talvez pelo fato de ser menos vergonhoso para a polícia combater o jovem do “grau” do que pintar muro pichado com símbolo de facção.

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