No Brasil, a política sempre foi um grande teatro, mas ultimamente tem se tornado uma peça de realismo mágico tão absurda que até Gabriel García Márquez pediria um tempo para respirar. O roteiro? Simples: enquanto o povo se debate entre a inflação e a desilusão, a cúpula do poder embarca em jatinhos oficiais para encontros solenes e sorrisos bem posados diante da história.
Agora, temos Janja e Wellington Dias em Roma. Motivo? Uma reunião com o Papa e a participação no evento do FIDA (Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola), essa entidade que, no papel, parece muito preocupada com a fome no mundo—mas que, na prática, ainda não resolveu nem o preço do arroz no Brasil. A ironia não escapa nem ao mais ingênuo dos espectadores: enquanto discutem a fome global em mesas fartas e salões renascentistas, por aqui, descobrimos um novo escândalo no Ministério do Desenvolvimento Social. A famigerada “ONG das quentinhas”—um caso que, se o Brasil fosse um país sério, já estaria rendendo prisões, mas, como somos o que somos, talvez renda apenas uma troca de ministros e algumas notas oficiais indignadas.
A viagem de Janja e Wellington Dias para Roma tem um simbolismo curioso. O Brasil, afinal, é uma nação que sempre teve um estranho fetiche por buscar legitimidade lá fora. O presidente dá uma entrevista em Davos e parece que o PIB melhora por telepatia. Um ministro é recebido no exterior e pronto: achamos que o Brasil voltou ao centro das decisões mundiais. Mas enquanto eles passeiam entre as colunas do Vaticano, por aqui, a crise segue como um mendigo invisível na porta do Planalto.
E o Papa? Bem, Francisco é um homem inteligente. Já conversou com Lula, já abençoou políticos de todo tipo e já percebeu que o Brasil é um país onde a fé e a corrupção andam de mãos dadas. Certamente ele dará sua bênção, posará para as fotos e desejará sorte—porque, sejamos honestos, vamos precisar mais de mil ave-marias para resolver essa bagunça.
No entanto, enquanto Janja e Wellington fazem turismo institucional, Flávio Bolsonaro, sempre atento às oportunidades, já acionou o Tribunal de Contas da União contra o ministro. Claro, porque os bolsonaristas nunca perderiam a chance de apontar a corrupção alheia enquanto fingem que rachadinhas são um fenômeno sobrenatural sem culpados. A política brasileira é isso: um grande espelho onde ninguém se enxerga.
O mais curioso é que, no final das contas, ninguém sairá realmente prejudicado. O escândalo da ONG das quentinhas pode até derrubar Wellington Dias, mas outro ocupará seu lugar em poucos dias. A viagem a Roma não resolverá a fome no Brasil, mas gerará manchetes positivas nos jornais simpáticos ao governo. E Flávio Bolsonaro continuará fazendo oposição seletiva enquanto torce para que ninguém lembre de seus próprios processos.
E nós? Nós assistimos a tudo como quem vê uma novela ruim que não consegue parar de acompanhar. Talvez, no fundo, sejamos todos cúmplices desse grande espetáculo. Afinal, no Brasil, quem pode viaja, quem manda se protege e quem tem Janja… vai a Roma.