O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) proferiu uma decisão por maioria de votos, declarando inconstitucionais dispositivos de lei complementar federal que deslocavam a competência para a cobrança do Imposto Sobre Serviços (ISS) do município do prestador do serviço para o do tomador. O julgamento ocorreu na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 499 e nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 5835 e 5862, finalizando-se na sessão virtual encerrada em 2 de junho.
As ações questionavam a validade de dispositivos da Lei Complementar (LC) 116/2003, que foram alterados pela LC 157/2016. Essas alterações determinavam que o ISS seria devido no município do tomador do serviço em casos específicos, como planos de medicina em grupo ou individual, administração de fundos e carteira de clientes, administração de consórcios, administração de cartões de crédito ou débito e arrendamento mercantil (leasing).
Em 2018, o ministro Alexandre de Moraes, relator dos casos, concedeu uma liminar suspendendo os efeitos desses dispositivos. Ele argumentou que a nova disciplina normativa deveria estabelecer claramente o conceito de “tomador de serviços”, a fim de evitar insegurança jurídica e a possibilidade de dupla tributação ou incidência tributária inadequada.
Posteriormente, a LC 175/2020 definiu a figura do “tomador dos serviços” para as atividades mencionadas e estabeleceu um sistema nacional para o cumprimento das obrigações acessórias relacionadas ao imposto municipal. As alterações promovidas por essa lei foram incluídas nas ações judiciais.
No mérito, ao votar pela procedência do pedido, o ministro Alexandre de Moraes verificou que a LC 157/2020 não definiu adequadamente a figura do tomador dos serviços nas situações discutidas no caso, o que, em sua opinião, mantém a insegurança jurídica apontada na análise da liminar. Para o ministro, é necessária uma regulamentação que proporcione segurança jurídica, e não o contrário, “sob pena de retrocesso em um tema tão sensível para o pacto federativo”.
O relator também destacou as inconsistências apontadas pelos autores das ações. Por exemplo, no caso de planos de saúde, a lei considerava o beneficiário vinculado à operadora como tomador, mas permanecia a dúvida sobre qual seria o domicílio do beneficiário, se seria o cadastro do cliente, o domicílio civil ou o domicílio fiscal.
Em relação à administração de consórcios e fundos de investimento, a lei estabeleceu que o tomador seria o cotista. No entanto, o ministro ressaltou que questões sobre o domicílio do cotista, especialmente se ele reside no exterior ou tem mais de um domicílio, não foram solucionadas. Quanto à administração de cartões e ao arrendamento mercantil, também persistem dúvidas sobre o local efetivo de domicílio do tomador, deixando margem para que mais de uma pessoa possa ser legitimada.
Portanto, de acordo com o relator, as incertezas geradas pelas normas mantêm o potencial de conflito fiscal. Ele afirmou que apenas com uma definição clara e abrangente de todos os aspectos da hipótese de incidência é possível ter previsibilidade e evitar conflitos de competência em questões tributárias.
Os ministros Nunes Marques e Gilmar Mendes ficaram vencidos, uma vez que entenderam que a LC 157/2020 resolveu as insuficiências apontadas na decisão cautelar.
Essa decisão do STF traz repercussões importantes para a cobrança do ISS e para a definição da competência tributária entre municípios e prestadores de serviços. Agora, cabe aos órgãos competentes revisarem a legislação pertinente a fim de proporcionar uma regulamentação mais clara e coerente com a Constituição Federal.