A tragédia do desabamento de dois prédios na Muzema, zona sudoeste do Rio de Janeiro, continua a repercutir. A justiça carioca decidiu encerrar, sem julgamento de mérito, o processo que envolvia dois homens acusados de 24 homicídios dolosos e três lesões corporais graves. O desabamento, que ocorreu em 12 de abril de 2019, resultou na morte de 24 pessoas e deixou três gravemente feridas.
Desfecho do processo em tribunal
Em uma decisão surpreendente, a juíza Alessandra da Rocha Lima Roidis, da 1ª Vara Criminal do Rio, impronunciou os acusados Rafael Gomes da Costa e Renato Siqueira Ribeiro. Em sua análise, a magistrada considerou que os depoimentos das testemunhas não apontavam para o envolvimento direto dos réus nas irregularidades estruturais dos edifícios. Ambos atuavam como revendedores, o que os colocava em uma situação similar à de corretores de imóveis, e, segundo a juíza, não havia indícios suficientes que provassem seu conhecimento sobre o estado das construções.
“Conforme ressaltado pelo Ministério Público, as irregularidades estruturais não podem ser presumidas como de conhecimento de revendedor”, destacou a juíza em sua decisão. Com a impronúncia, os dois homens não serão levados a júri popular, o que levanta questionamentos sobre a responsabilização em casos de desastres gerados por construções irregulares.
O papel de José Bezerra de Lira
O terceiro acusado, José Bezerra de Lira, conhecido como “Zé do Rolo”, também enfrentou um rebaixamento nas acusações. Inicialmente acusado de homicídio doloso, sua responsabilidade foi desclassificada para o crime de desabamento com mortes culposas, que prevê penas significativamente menores — até quatro anos de prisão. A juíza afirmou que, embora ele tenha sido identificado como responsável pela construção dos prédios, não foi comprovado que tivesse a intenção de causar mortes. Assim, também ele não enfrentará um júri popular.
“As provas carreadas aos autos não indicam que a conduta do réu tenha sido cometida com a intenção de causar perigo de morte”, concluiu Roidis, afastando a prática de crime doloso.
Construções irregulares e a atuação da milícia na Muzema
Os prédios que desabaram, com cinco andares cada, foram construídos de maneira irregular em uma área marcada pela influência de milicianos. A Prefeitura do Rio já havia interditado os edifícios antes do trágico evento. A justiça, uma semana após o desabamento, decretou a prisão temporária dos três homens, investigados por integrantes de um esquema de construção e comercialização ilegal de imóveis na região.
A decisão judicial levanta questões cruciais sobre a responsabilidade de pessoas que atuam na venda de imóveis em áreas com construções irregulares, especialmente quando essas edificações já apresentavam sinais de perigo. A prática de construir em desacordo com a legislação não é apenas um problema urbanístico, mas uma questão de segurança pública, que demanda uma fiscalização mais efetiva e responsabilização para evitar que tragédias semelhantes se repitam.
A sociedade e as consequências do desabamento
O desabamento na Muzema é um triste lembrete dos riscos associados à construção irregular e à falta de regulamentação. As 24 vidas perdidas representam não apenas uma estatística, mas dores e histórias de famílias devastadas por uma negligência que poderia ter sido evitada. A sociedade clama por justiça e por um sistema que realmente responsabilize aqueles que colocam em risco a vida de tantas pessoas em busca de lucro a qualquer custo.
Com o fim do processo, muitos ainda se perguntam se a justiça foi realmente feita ou se, de alguma maneira, os responsáveis conseguiram escapar da penalização. A necessidade de uma investigação mais aprofundada sobre as práticas de construção na Muzema e em outras áreas similares se faz premente, assim como a importância de garantir que tais coisas não voltem a ocorrer no futuro.
A repercussão deste caso deve servir como um alerta para as autoridades e a sociedade, destacando a importância de um rigor maior na fiscalização de obras, especialmente em áreas irregulares, para garantir que tragédias como essa permaneçam no passado. A luta por justiça, embora encerrada no tribunal, continua nas mentes e corações dos que perderam seus entes queridos no desabamento da Muzema.
Fonte: G1

