Pete Hegseth, o Secretário de Defesa dos Estados Unidos, está vivendo a mais séria crise de sua gestão, cercado por alegações de crimes de guerra no Caribe e um devastador relatório de inspetoria que o acusa de gerenciar inadequadamente informações militares classificadas. Apesar da longa lista de problemas e dos apelos por sua demissão, Hegseth não demonstra sinais de se afastar do cargo e ainda conta com o apoio de Donald Trump.
Acusações graves e pressão política
As crises que envolvem Hegseth estão ligadas a alegações que políticos, especialistas em políticas e ex-oficiais afirmam revelar um padrão de imprudência perigosa no comando do Pentágono. Legisladores democratas reativaram os pedidos por sua exoneração após a revelação de que sobreviventes de um ataque a um barco em setembro foram deliberadamente mortos em um ataque de “duplo golpe”. Ao mesmo tempo, uma investigação do Departamento de Defesa divulgada na quinta-feira concluiu que Hegseth violou políticas do Pentágono ao compartilhar detalhes sensíveis através do aplicativo Signal horas antes de ataques aéreos no Iémen.
O foco da campanha caribenha gira em torno das operações extrajudiciais da administração Trump contra suspeitos de tráfico de drogas, que resultaram na morte de pelo menos 87 pessoas em 22 ataques desde setembro. Trump justifica a operação como essencial para combater o tráfico de fentanil, afirmando que cada embarcação destruída salva 25.000 vidas americanas. Entretanto, especialistas em política de drogas e ex-oficiais consideram esse número absurdo, já que o fentanil entra nos Estados Unidos principalmente pela terra, vindo do México, e não por barcos do Caribe.
Legalidade dos ataques sob questionamento
A legalidade dos ataques foi intensamente analisada após o público tomar conhecimento de que dois homens que sobreviveram ao ataque inicial de 2 de setembro estavam visíveis entre os destroços quando um novo ataque letal foi ordenado. Embora Hegseth tenha inicialmente descartado a reportagem como fabricada, ele posteriormente confirmou os fatos básicos durante uma reunião de gabinete esta semana, dizendo que agiu na “neblina da guerra”, mas que “não ficou por ali” para observar o restante da missão.
Desemprego iminente?
A senadora Patty Murray, vice-presidente do comitê de apropriações do Senado, pediu a demissão de Hegseth após uma apresentação bipartidária sobre o incidente na quinta-feira. “Entre supervisionar esta campanha no Caribe, arriscar a vida de membros das forças armadas ao compartilhar planos de guerra no Signal, e tantas outras questões, está cada vez mais claro que o Secretário Hegseth não está à altura do cargo, e já passou da hora dele sair”, afirmou Murray.
A New Democrat Coalition, o maior caucus democrático na Câmara, composto por 116 membros que se descrevem como moderados em questões fiscais e pró-inovação, emitiu uma declaração chamando Hegseth de “incompetente, imprudente e uma ameaça à vida dos homens e mulheres que servem nas forças armadas”. O presidente da coalizão, Brad Schneider, e o presidente do grupo de trabalho de segurança nacional, Gil Cisneros, acusaram o secretário de mentir, desviar a responsabilidade e colocar a culpa em subordinados, ao mesmo tempo em que se recusa a assumir a responsabilidade.
Opiniões divergentes sobre a estratégia do Caribe
A lógica estratégica da campanha caribenha recebeu críticas até mesmo de ex-funcionários do governo dos EUA. Jake Braun, que atuou como diretor adjunto nacional interino de cibersegurança na administração Biden e assessor sênior do secretário de segurança interna, questionou por que a administração estava focando os recursos militares no Caribe ao invés das rotas primárias de tráfico.
“Acho que o uso da força militar é justificado – mas parece que eles estão a cerca de 2.500 milhas do alvo principal, no México”, disse Braun. “Se eles querem parar o fentanil, eu me concentraria mais em túneis e drones no Arizona, em vez de barcos no Caribe.”
A diretora-executiva da Airwars, Emily Tripp, uma organização que monitora danos civis em conflitos militares, pediu maior transparência sobre os ataques, afirmando que a organização gostaria de saber “quais considerações são feitas em relação a sobreviventes de naufrágios, e por que o uso da força foi escolhido em vez de uma operação de busca e resgate quando, até onde entendemos, os alvos aqui são as drogas, e não as pessoas a bordo”.
A resposta do Pentágono
O Pentágono teve dificuldades em fornecer respostas claras sobre a cadeia de comando dos ataques, e a Casa Branca inicialmente sugeriu que o Almirante Frank Bradley, comandante das operações especiais do Comando Sul, ordenou o ataque subsequente em legítima defesa. No entanto, Hegseth disse depois que Bradley tomou a decisão com a autorização dele, mas tinha total autonomia para agir independentemente. Trump alegou não saber nada sobre os detalhes operacionais e, até mesmo, sugeriu que não teria desejado o segundo ataque.
Além disso, um relatório do inspetor geral do Departamento de Defesa, divulgado na quinta-feira, determinou que Hegseth violou as políticas do Pentágono ao usar o Signal para compartilhar detalhes precisos sobre ataques aéreos iminentes no Iémen, incluindo a quantidade e os horários de ataque de aeronaves dos EUA sobre território hostil, aproximadamente duas a quatro horas antes das missões serem executadas.
O relatório concluiu que as ações de Hegseth “criaram um risco à segurança operacional que poderia ter resultado em falhas nos objetivos da missão dos EUA e em potencial perigo para os pilotos americanos”. Informações que eram consideradas secretas e não deveriam ser compartilhadas com estrangeiros foram transmitidas por meio do dispositivo pessoal não classificado de Hegseth em chats de grupo com outros oficiais da administração Trump.
Apesar das conclusões do inspetor geral, Hegseth afirmou estar vindicado nas redes sociais, postando em sua conta pessoal que não havia “informações classificadas. Total exculpação. Caso encerrado.”
Controvérsias dentro do Pentágono
A gestão de Hegseth também tem sido marcada por severas disfunções dentro do próprio Pentágono, onde seus assessores, no início do ano, vazaram informações uns contra os outros, em um clima que vários oficiais descrevem como paranoico e caótico. O secretário de Defesa usou uma investigação sobre vazamentos – da qual a Casa Branca supostamente havia perdido a confiança – para demitir três conselheiros principais na primavera, alegando que eles foram identificados através do que corresponderia a uma escuta ilegal da NSA. O episódio repercutiu, levantando novas questões sobre o bom senso de Hegseth e sua capacidade de gerir o departamento.
Apesar das controvérsias que caracterizam uma situação insustentável para o secretário, Trump continua a respaldar Hegseth publicamente, com a Casa Branca expressando “a máxima confiança” em sua equipe de segurança nacional. Dado que o Senado é controlado por republicanos e Trump mantém seu apoio, é improvável que Hegseth enfrente consequências significativas.
A administração Trump alega que sua campanha de combate ao tráfico no Caribe mira embarcações operadas por organizações terroristas designadas, como o Tren de Aragua da Venezuela e o Exército de Libertação Nacional da Colômbia, embora não tenha apresentado evidências públicas para essas designações. A administração afirma estar em um conflito armado com os cartéis de drogas, permitindo ações militares sem autorização do Congresso, embora especialistas jurídicos contestem essa narrativa.
Em uma reunião de gabinete na terça-feira, Hegseth não demonstrou sinais de recuar, afirmando que o exército “mal começou a atacar barcos de narcotraficantes e colocar narcoterroristas no fundo do oceano”, embora tenha notado uma pausa devido à dificuldade em encontrar barcos para atacar. Desde então, um novo ataque que resultou na morte de quatro pessoas foi anunciado na quinta-feira.


