A intenção do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), de criar um código de conduta para integrantes de tribunais superiores está sendo bem recebida em diferentes setores da sociedade brasileira. A proposta é respaldada por sugestões recorrentes da academia e exemplos de códigos de conduta de países como Alemanha, Estados Unidos e França, que foram apresentados em estudos entregues a Fachin logo após sua posse como presidente da Corte, há pouco mais de dois meses.
Apoio acadêmico e propostas internacionais
Defendida por pesquisadores e especialistas, a ideia de instituir um guia para juízes de tribunais superiores ganhou força recentemente, especialmente após o colunista Lauro Jardim revelar que o ministro Dias Toffoli viajou em um jatinho particular com advogados de um caso que ele relatora, gerando polêmica e questionamentos sobre a conduta de membros da Corte. Esses acontecimentos revelam a necessidade urgente de um código ético que defina claramente o que é permitido e o que não é nas relações dos ministros com a sociedade e o mundo político.
O documento, intitulado “A Responsabilidade pela Última Palavra: Contribuição para o aperfeiçoamento institucional da jurisdição constitucional brasileira”, foi coordenado por Oscar Vilhena, Sergio Fausto e Ana Laura Barbosa, e conta com as assinaturas de ex-ministros de peso como Cezar Peluso e José Carlos Dias. O estudo defende que um dos eixos do código deve focar no “Fortalecimento da reputação pública do tribunal”, abordando possíveis diretrizes sobre a conduta dos juízes.
Referenciais de conduta estabelecidos
Segundo Oscar Vilhena, diretor da FGV Direito SP, esse movimento é extremamente positivo: “Aguardamos há muito tempo um código de conduta. É mais que necessário para a sociedade ter clareza do que é permitido e cobrar os ministros quando fizerem algo fora do código”, afirma. A proposta se inspira fortemente no modelo alemão, que possui 16 dispositivos claros que regulam a conduta dos juízes.
O primeiro princípio do código alemão estipula que os ministros devem se comportar de modo a não comprometer o prestígio do tribunal e a dignidade do cargo, tanto dentro quanto fora do exercício de suas funções. Além disso, é essencial que as participações em eventos e atividades externas não prejudiquem a reputação da Corte ou suscitem dúvidas sobre a independência e imparcialidade dos juízes.
Na Alemanha, um dos aspectos tratados é a postura dos ministres em entrevistas, enfatizando que suas declarações devem estar em conformidade com o prestígio do tribunal e a dignidade do cargo. Essa preocupação com a aparência também aparece em outros modelos, como o francês, que destaca a importância de evitar situações que possam levantar dúvidas sobre a imparcialidade dos membros da jurisdição.
Experiência dos EUA e questões de aparência
Com experiências semelhantes nos Estados Unidos, o debate sobre a conduta de ministros da Suprema Corte ganhou destaque após denúncias envolvendo o ministro Clarence Thomas. O código de conduta americano alerta que ministros não devem participar de eventos que possam apresentar um conflito de interesses, garantindo que suas ações não criem a percepção de impropriedade aos olhos do público.
Na visão do professor da FGV Rubens Glezer, um dos signatários do estudo apresentado a Fachin, a experiência internacional é valiosa, mas o código brasileiro deve se pautar em diagnósticos próprios. “Não se trata de uma tentativa de transplantar uma solução estrangeira. A proposta surge da análise das especificidades do Supremo e dos problemas que ele enfrenta há décadas. É essencial criar um parâmetro que sirva para reforçar a institucionalidade do tribunal”, afirma acentuando que a reputação da Corte deve ser preservada e restaurada.
Desafios e o caminho a seguir
Fachin está engajado em dialogar com os integrantes da Corte, assim como com presidentes de outros tribunais superiores. No entanto, a expectativa é que a concretização do projeto enfrente dificuldades e necessite de negociações extensivas. Em 2023, por exemplo, uma tentativa da ministra Rosa Weber, então presidente do STF, de regulamentar a participação de juízes em eventos patrocinados por grandes empresas, provocou resistência no Judiciário.
Conforme se desenrola o debate sobre a criação de um código de conduta, é claro que a sociedade e os especialistas esperam por um maior comprometimento dos ministros com a ética e a transparência nas suas ações, aprimorando assim a confiabilidade do Judiciário perante a população.
Colaborou Mariana Muniz, de Brasília



