O projeto antifacção, crucial na luta do governo Lula contra o crime organizado, continua gerando tensões na Câmara dos Deputados. Recentemente, o deputado Guilherme Derrite (PP-SP), relator da proposta, enfrentou duras críticas ao excluir o “perdimento extraordinário de bens” de sua última versão. Essa medida, que permitiria a apreensão antecipada de bens ligados a atividades criminosas, caiu em desgraça na nova redação, suscitando um debate acirrado entre aliados do Planalto e o parlamentar.
O que é o projeto antifacção?
O projeto antifacção visa fortalecer as ferramentas legais de combate ao crime organizado no Brasil. A premissa central do projeto é a agilidade nas medidas de confisco de bens ilegais, buscando desmantelar a estrutura financeira de organizações criminosas. Atualmente, a legislação brasileira exige que um bem seja confiscado apenas após um veredito condenatório, o que pode demorar anos, permitindo que bens adquiridos ilicitamente permaneçam com os suspeitos.
Consequências da exclusão do perdimento extraordinário
Na versão anterior do projeto, o “perdimento extraordinário” permitiria a declaração de perda de bens relacionados a crimes, independentemente do resultado de um processo judicial. Nesta perspectiva, o Ministério da Justiça havia proposto a inclusão de novos artigos no Código de Processo Penal, permitindo que juízes tomassem decisões sobre o confisco antes mesmo do encerramento dos processos, caso houvesse indícios suficientes de que os bens eram fruto de actividades ilícitas.
Contudo, ao retirar essa cláusula de sua proposta, Derrite acabou por introduzir uma “ação civil de perdimento de bens”, que ainda tem respaldo profissional e jurídico, mas não cumpre a mesma função preventiva que o perdimento extraordinário traria. Especialistas temem que essa modificação torne o processo mais moroso e complicado, já que a nova abordagem dependerá de novas ações judiciais.
Visões divergentes sobre o confisco antecipado
O debate sobre a antecipação do confisco de bens do crime organizado é polarizado. Especialistas, como o procurador federal Vladimir Aras, defendem que a medida é essencial para a recuperação de ativos, permitindo que as autoridades ajam rapidamente para bloquear as fortunas de criminosos. Aras destaca que a ação civil proposta por Derrite se alinha a práticas recomendadas pela ONU e que buscam retirar activeis de mãos criminosas.
Por outro lado, críticos alertam que a mudança proposta pode reverter a lógica de que apenas pessoas condenadas deveriam perder seus bens. Thiago Bottino, professor da FGV Direito Rio, acredita que tanto a proposta do governo quanto a versão de Derrite “invertem o ônus da prova”. Nesse sentido, a presunção de inocência, pilar fundamental do direito penal, poderia ser comprometida, uma vez que bens poderiam ser confiscados sem uma condenação clara.
O embate político entre o governo e Derrite
A disputa que envolve a revisão do projeto antifacção se intensificou com a resposta do governo às mudanças feitas por Derrite. A ministra de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, fez um apelo para que ministérios se unam e ajudem a aprovar a PEC da Segurança, que caminha paralelamente ao projeto antifacção. Gleisi enfatizou a necessidade de que o “perdimento extraordinário” seja readmitido ao projeto, considerando-o essencial para o combate efetivo ao crime organizado.
As discordâncias entre o governo e o relator refletem não apenas uma divisão de opiniões sobre a eficácia das medidas, mas também o jogo político que frequentemente permeia a análise de propostas cruciais na agenda legislativa do país. O desafio será encontrar um meio-termo que não comprometa a eficácia do combate ao crime, mantendo os direitos individuais de pessoas ainda não condenadas, numa balança delicada entre segurança pública e garantias legais.
Perspectivas futuras
A discussão sobre o projeto antifacção está longe de ser resolvida, e a pressão para avançar com soluções que garantam a segurança pública se intensifica, especialmente após episódios violentos como o recente caso no Rio de Janeiro. O governo Lula, ciente de que a aprovação de medidas contundentes é fundamental, continua insistindo em um caminho que vá ao encontro das recomendações e necessidades expertas, enquanto lida com as complexidades do parlamento e as discussões sobre direitos humanos.
À medida que as negociações prosseguem, a população brasileira acompanha de perto as movimentações que podem significar uma mudança significativa no combate à criminalidade e, ao mesmo tempo, afetar as normas jurídicas que salvaguardam os cidadãos.


